Hebreus 5 é um daqueles textos que me faz olhar para Cristo com ainda mais admiração. Sempre que leio este capítulo, me lembro que a nossa salvação não está baseada em esforços humanos, mas em alguém que foi designado por Deus, que sofreu como nós e que hoje intercede por nós como sumo sacerdote perfeito. Mas também é um capítulo que me confronta, porque mostra o quanto podemos ser imaturos na fé, mesmo depois de tanto tempo de caminhada.
Qual é o contexto histórico e teológico de Hebreus 5?
A Epístola aos Hebreus foi escrita para cristãos judeus que estavam sob pressão para abandonar o evangelho e voltar ao judaísmo tradicional. Muitos viviam provavelmente em Roma ou em grandes centros urbanos do Império, e sofriam perseguições e discriminação. Eles conheciam o Antigo Testamento, as figuras dos sumos sacerdotes, os sacrifícios e as promessas messiânicas.
Na Palestina, o sumo sacerdócio já estava corrompido, usado como ferramenta política pelos romanos. No entanto, o autor de Hebreus não foca nas distorções, mas no princípio bíblico original: o sumo sacerdote era escolhido por Deus, representava o povo diante do Senhor e oferecia sacrifícios pelos pecados.
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Simon Kistemaker explica que o autor segue a lógica do Antigo Testamento, não as práticas distorcidas de sua época. Ele mostra que Jesus é o cumprimento perfeito do sacerdócio, superior a Arão, com um chamado eterno e um ministério imaculado (KISTEMAKER, 2013).
Craig Keener lembra que o sacerdócio de Cristo, baseado em Melquisedeque, traz algo que os judeus não esperavam: um sacerdote que não vem da linhagem de Arão, mas que é também rei, e cuja função ultrapassa as limitações humanas (KEENER, 2017).
Além disso, o capítulo faz um alerta pastoral. O autor reconhece que os leitores estão espiritualmente acomodados, lentos para aprender, o que impede o crescimento e o entendimento dessas verdades profundas.
Como o texto de Hebreus 5 se desenvolve?
1. Qual o papel do sumo sacerdote humano? (Hebreus 5.1-3)
O autor começa com um resumo da função do sumo sacerdote:
“Todo sumo sacerdote é escolhido dentre os homens e designado para representá-los em questões relacionadas com Deus e apresentar ofertas e sacrifícios pelos pecados.” (Hebreus 5.1)
O sumo sacerdote era um representante do povo diante de Deus. Por ser humano, ele conhecia as fraquezas e limitações do povo e também as suas próprias. Por isso, oferecia sacrifícios tanto pelos outros quanto por si mesmo (Hebreus 5.2-3).
Essa limitação, aliás, revela o quanto o sistema antigo era apenas um “sombra” do verdadeiro sacerdócio, como Paulo também diz em Colossenses 2.17.
2. Como Cristo se tornou sumo sacerdote? (Hebreus 5.4-6)
O autor deixa claro que ninguém assume esse ofício por vontade própria:
“Ninguém toma esta honra para si mesmo, mas deve ser chamado por Deus, como de fato o foi Arão.” (Hebreus 5.4)
Da mesma forma, Cristo não tomou para si a glória do sacerdócio. Ele foi chamado pelo próprio Deus:
“Tu és meu Filho; eu hoje te gerei.” (Hebreus 5.5, citando o Salmo 2.7)
E também:
“Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque.” (Hebreus 5.6, citando o Salmo 110.4)
Keener destaca que Melquisedeque era rei e sacerdote, algo inédito em Israel, onde as funções eram separadas. Mas nele há um modelo profético de Cristo: um sacerdote eterno, que não vem da linhagem de Levi, mas é diretamente designado por Deus (KEENER, 2017).
3. O sofrimento de Cristo o qualifica? (Hebreus 5.7-10)
O autor então destaca um ponto que sempre me faz refletir:
“Durante os seus dias de vida na terra, Jesus ofereceu orações e súplicas, em alta voz e com lágrimas, àquele que o podia salvar da morte, sendo ouvido por causa da sua reverente submissão.” (Hebreus 5.7)
Imediatamente penso no Getsêmani, quando Jesus suou sangue e orou ao Pai, dizendo: “Meu Pai, se for possível, afasta de mim este cálice. Contudo, não seja como eu quero, mas sim como tu queres.” (Mateus 26.39).
Jesus sofreu como homem, chorou, clamou. E, mesmo sendo Filho de Deus, aprendeu a obediência por meio do sofrimento (Hebreus 5.8).
Isso não significa que Jesus era desobediente, mas que, em sua humanidade, ele experimentou o preço da obediência, o que o qualificou como sumo sacerdote perfeito.
O texto segue:
“E, uma vez aperfeiçoado, tornou-se a fonte de eterna salvação para todos os que lhe obedecem.” (Hebreus 5.9)
Aqui está a diferença essencial: enquanto os sumos sacerdotes do Antigo Testamento ofereciam sacrifícios temporários, Jesus se tornou a fonte de salvação eterna, como também diz João 14.6.
4. Por que os leitores estavam lentos para aprender? (Hebreus 5.11-14)
O autor então muda de tom e faz uma exortação:
“Temos muito que dizer, coisas difíceis de explicar, porque vocês se tornaram lentos para aprender.” (Hebreus 5.11)
Eu sempre penso em como esse alerta se aplica a nós hoje. Vivemos cercados de informações, com acesso fácil à Bíblia, mas quantas vezes somos lentos para aprender, acomodados na fé?
O autor diz que, pelo tempo de caminhada, os leitores já deveriam ser mestres, mas ainda precisavam do leite espiritual (Hebreus 5.12), como Paulo também alertou em 1 Coríntios 3.1-2.
Ele usa o contraste entre o leite, para os imaturos, e o alimento sólido, para os adultos espirituais. Os maduros, diz o texto, são aqueles que, pelo exercício constante, desenvolveram o discernimento entre o bem e o mal (Hebreus 5.14).
Isso me lembra que maturidade não vem do tempo de igreja, mas do exercício constante da fé e do estudo das Escrituras.
Que conexões proféticas encontramos em Hebreus 5?
Este capítulo está profundamente conectado com as promessas do Antigo Testamento. A citação do Salmo 2 revela Cristo como o Filho de Deus, exaltado e soberano. Já o Salmo 110 apresenta esse Filho como sacerdote eterno, segundo a ordem de Melquisedeque.
Além disso, o sofrimento de Jesus cumpre as profecias de Isaías 53, onde o Servo Sofredor carrega o pecado do povo e intercede por eles.
Kistemaker ressalta que o sacerdócio de Cristo une o que antes era separado: realeza e sacerdócio. Ele é o Rei prometido a Davi e o sacerdote perfeito, que oferece o sacrifício definitivo (KISTEMAKER, 2013).
Essa união aponta para a restauração completa entre Deus e o homem, não apenas por meio de rituais, mas por meio de Cristo, o Mediador, como Paulo explica em 1 Timóteo 2.5-6.
O que Hebreus 5 me ensina para a vida hoje?
Esse capítulo me mostra duas coisas essenciais.
Primeiro, me leva a olhar para Cristo com reverência e gratidão. Ele é o sumo sacerdote perfeito, que conhece minha dor, intercede por mim e abriu um caminho de salvação eterna.
Segundo, me confronta. Será que eu, com todo o acesso que tenho à Palavra, ainda estou preso ao leite espiritual? Será que, como os leitores de Hebreus, me acomodei e parei de crescer?
Eu aprendo que preciso buscar maturidade, me aprofundar no conhecimento de Deus e exercitar o discernimento espiritual todos os dias.
Além disso, Hebreus 5 me lembra que sofrimento faz parte do caminho. Jesus aprendeu obediência através do sofrimento, e nós também amadurecemos assim.
Que eu nunca me conforme com uma fé rasa, mas avance, compreenda melhor as Escrituras e me aproxime de Cristo, nosso sumo sacerdote eterno.
Referências
- KISTEMAKER, Simon. Hebreus. 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2013.
- KEENER, Craig S. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Novo Testamento. Tradução: José Gabriel Said. Edição Ampliada. São Paulo: Vida Nova, 2017.
- Bíblia Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Sociedade Bíblica Internacional, 2001.