O Salmo 110 é atribuído a Davi, como confirmado por Jesus em Mateus 22:43 e pelos apóstolos em Atos 2:34. Diferente de muitos salmos que expressam lamentos ou súplicas, este é uma declaração majestosa sobre o governo e o sacerdócio eternos do Messias. Trata-se do salmo mais citado no Novo Testamento, com 21 referências diretas ou alusivas a ele, especialmente no livro de Hebreus.
Esse salmo é reconhecido pela tradição cristã como uma das passagens mais claras sobre o Messias no Antigo Testamento. Sua linguagem combina elementos reais (governo) com sacerdotais, algo inédito na prática israelita. Como observa Hernandes Dias Lopes, “esse salmo é a coroa de todos os salmos, pois exalta o Messias em sua entronização, vitória e sacerdócio eterno” (LOPES, 2022, p. 1189).
O pano de fundo histórico inclui a visão israelita de um rei davídico que governaria sob a direção de Deus. No entanto, o conteúdo do salmo transcende qualquer realidade política de Davi. Como destaca João Calvino, “nenhum rei, nem Davi, poderia ao mesmo tempo exercer o sacerdócio eterno segundo a ordem de Melquisedeque” (CALVINO, 2009, p. 95). Trata-se, portanto, de uma profecia messiânica que aponta diretamente para Cristo, o Rei-Sacerdote.
Segundo Walton, Matthews e Chavalas, a figura de Melquisedeque e a imagem do estrado dos pés têm paralelos históricos no Antigo Oriente, onde reis dominadores pisavam o pescoço de seus inimigos vencidos (WALTON et al., 2018, p. 717). Isso mostra que o salmo comunica poder e domínio absoluto.
1. A entronização do Messias (Salmo 110:1)
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“O Senhor disse ao meu Senhor: ‘Senta-te à minha direita até que eu faça dos teus inimigos um estrado para os teus pés’.”
Esse versículo estabelece o tema central do salmo: a autoridade divina conferida ao Messias. Yahweh convida o Senhor de Davi a sentar-se à sua direita — posição de honra, autoridade e igualdade. Jesus utilizou esse versículo para mostrar aos fariseus que o Messias era maior do que Davi, sendo ao mesmo tempo seu Senhor e seu descendente (Mateus 22:41–46).
Calvino observa que “o trono de Cristo é exaltado muito acima de todos os principados nos lugares celestiais” (CALVINO, 2009, p. 95). A expressão “senta-te à minha direita” implica que sua obra redentora está concluída e que ele reina até que todos os inimigos sejam colocados debaixo de seus pés, como reafirma 1 Coríntios 15:25.
2. O domínio estendido do Messias (Salmo 110:2)
“O Senhor estenderá o cetro de teu poder desde Sião, e dominarás sobre os teus inimigos!”
Aqui, o cetro representa o governo real. Sião, símbolo da presença divina, é o ponto de partida de um reino que se estenderá até os confins da terra. Hernandes Dias Lopes afirma que “mesmo diante da resistência, o domínio de Cristo será global” (LOPES, 2022, p. 1191).
O cetro não é apenas símbolo de autoridade, mas do poder soberano que Cristo exerce sobre todas as nações. Como cristão, ao ler esse versículo, eu percebo que o reinado de Jesus não se limita à esfera espiritual. Ele é Senhor sobre tudo e todos, ainda que muitos hoje não reconheçam esse governo.
3. A disposição do povo messiânico (Salmo 110:3)
“Quando convocares as tuas tropas, o teu povo se apresentará voluntariamente. Trajando vestes santas, desde o romper da alvorada os teus jovens virão como o orvalho.”
A imagem é de um exército espiritual formado por voluntários. São pessoas que servem ao Rei com alegria e santidade. Como observa Spurgeon, “eles se apressam, com alegria, para reconhecer o seu domínio, respondendo ao chamado do Evangelho” (LOPES, 2022, p. 1192).
A comparação com o orvalho expressa beleza, pureza e multiplicação. Calvino vê nessa imagem a expansão admirável da Igreja, que, “como gotas de orvalho, brota silenciosa, mas poderosamente sobre a terra” (CALVINO, 2009, p. 98). Como cristão, eu aprendo que seguir Jesus deve ser uma escolha voluntária e marcada por consagração.
4. O sacerdócio eterno do Messias (Salmo 110:4)
“O Senhor jurou e não se arrependerá: ‘Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque’.”
Este é o coração do salmo. Pela única vez na Bíblia, Deus faz um juramento acerca do ofício sacerdotal de alguém que não é da linhagem de Levi. Segundo Hernandes, “aqui temos uma declaração divina solene e imutável, conferindo a Jesus o sacerdócio eterno” (LOPES, 2022, p. 1193).
O autor de Hebreus cita esse versículo diversas vezes (Hebreus 5:6, 10; 6:20; 7:17, 21), argumentando que o sacerdócio de Jesus é superior ao de Arão. Ele é eterno, eficaz e baseado num juramento divino.
Calvino escreve que “o sacerdócio de Cristo se reveste de grande importância, visto que é ratificado pelo juramento de Deus” (CALVINO, 2009, p. 102). Como cristão, eu encontro nesse versículo segurança. Jesus intercede por mim eternamente.
5. O juízo e a vitória do Messias (Salmo 110:5–6)
“O Senhor está à tua direita; ele esmagará reis no dia da sua ira. Julgará as nações, amontoando os mortos e esmagando governantes em toda a extensão da terra.”
Esses versículos apresentam o Messias como Conquistador e Juiz. Ele derrotará todos os que se opõem ao seu reinado. Hernandes escreve: “O Cordeiro virá como Leão. Seu juízo será feroz e definitivo” (LOPES, 2022, p. 1195).
A linguagem é bélica e solene. A imagem de cadáveres amontoados revela a seriedade do juízo final. Como em Apocalipse 19:11–21, o Messias cavalga para a batalha e sai vitorioso.
Calvino comenta que “Cristo será gentil com os que se entregam a Ele, mas terrível com os que rejeitam o seu jugo” (CALVINO, 2009, p. 106). Essa é uma advertência séria para todos nós. Rejeitar o evangelho é escolher o juízo.
6. O descanso após a vitória (Salmo 110:7)
“No caminho beberá de um ribeiro, e então erguerá a cabeça.”
A imagem final é de um guerreiro que, após intensa batalha, refresca-se e segue vitorioso. Como observa Calvino, “Cristo não perde tempo, nem se deixa distrair. Bebe do ribeiro e continua sua marcha com cabeça erguida” (CALVINO, 2009, p. 107).
Essa cena aponta para a confiança absoluta do Messias na vitória final. Mesmo em meio ao combate, Ele não esmorece. Como cristão, eu aprendo que devo encontrar forças no meio da caminhada, lembrando que a vitória já está garantida por Cristo.
Cumprimento das profecias
Este salmo encontra cumprimento pleno na pessoa de Jesus Cristo. A entronização à direita de Deus é citada repetidamente em Hebreus 1:3, Romanos 8:34 e Atos 2:33. O sacerdócio segundo Melquisedeque é o argumento central do capítulo 7 de Hebreus.
Jesus não é apenas rei, mas também sacerdote eterno. Como o autor de Hebreus afirma: “portanto, ele é capaz de salvar definitivamente aqueles que, por meio dele, aproximam-se de Deus, pois vive sempre para interceder por eles” (Hebreus 7:25).
Significado dos nomes e simbolismos do Salmo 110
- Senhor à direita – Lugar de autoridade, honra e confiança divina.
- Estrado dos pés – Símbolo de total domínio sobre os inimigos.
- Cetro – Representa autoridade real e soberania invencível.
- Orvalho da juventude – Multidão silenciosa e pura, surgindo como o povo de Deus.
- Ordem de Melquisedeque – Um sacerdócio eterno, superior, sem genealogia e sem sucessão.
- Beber da torrente – Imagem de vigor e prontidão contínua do Messias.
Lições espirituais e aplicações práticas do Salmo 110
- Cristo reina agora – Jesus já está entronizado. Como cristão, eu não espero por um futuro governo, mas vivo sob sua autoridade hoje.
- Deus tem um plano eterno e invencível – Nenhum inimigo conseguirá impedir o avanço do Reino de Cristo.
- O povo de Deus se entrega voluntariamente – Obediência verdadeira vem do coração disposto, não da imposição.
- Jesus é nosso Sumo Sacerdote eterno – Não precisamos de mediadores humanos. Ele intercede por nós constantemente.
- A ira de Deus é real – O mesmo Cristo que salva também julgará os que o rejeitam.
- A vitória é certa – Como cristão, mesmo em tempos difíceis, eu descanso na certeza de que Cristo triunfará completamente.
- A resposta de fé é urgente – A cada versículo, o salmo me chama a submeter minha vida ao Rei-Sacerdote, sem demora.
Conclusão
O Salmo 110 é uma joia messiânica. Ele nos revela um Cristo exaltado, que reina com poder e intercede com graça. Nele se encontram a majestade do Rei e a compaixão do Sacerdote. Ao ler esse salmo, eu sou confrontado com a grandeza de Jesus e chamado a segui-lo com reverência, entrega e alegria. Seu reino não será abalado. Sua intercessão nunca falha. Seu juízo será justo. E sua vitória será completa.
Referências
- CALVINO, João. Salmos. Org. Franklin Ferreira, Tiago J. Santos Filho e Francisco Wellington Ferreira; trad. Valter Graciano Martins. 1. ed. São José dos Campos, SP: Editora Fiel, 2009. v. 4, p. 95–107.
- LOPES, Hernandes Dias. Salmos: O Livro das Canções e Orações do Povo de Deus. Org. Aldo Menezes. 1. ed. São Paulo: Hagnos, 2022. v. 1 e 2, p. 1189–1198.
- WALTON, John H.; MATTHEWS, Victor H.; CHAVALAS, Mark W. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Antigo Testamento. Trad. Noemi Valéria Altoé da Silva. 1. ed. São Paulo: Vida Nova, 2018. p. 717.