O capítulo 5 de 2 Reis se insere em um tempo de intensa instabilidade espiritual no Reino do Norte. Politicamente, Israel estava sob domínio de reis fracos e espiritualmente corrompidos. Apesar de algumas tréguas temporárias, a Síria (Aram) e Israel viviam num clima de tensão constante. Ainda assim, havia espaço para contatos diplomáticos, como vemos neste episódio envolvendo Naamã.
Naamã era comandante do exército sírio, servindo provavelmente a Ben-Hadade II, e um dos homens mais respeitados de sua nação. A Bíblia afirma que “por meio dele o Senhor dera vitória à Síria” (2 Rs 5.1), uma declaração surpreendente, pois revela que Deus agia soberanamente até sobre nações pagãs.
Espiritualmente, Israel continuava marcado pela idolatria, mesmo após os confrontos proféticos de Elias e, agora, a presença ativa de Eliseu. O rei de Israel — provavelmente Jorão — demonstrava desespero e incredulidade (2 Rs 5.7), incapaz de ver a ação de Deus em meio ao seu povo.
Segundo Constable (1985), “o fato de Naamã ser curado enquanto nenhum leproso em Israel o foi naquele tempo (cf. Lc 4.27) reforça a apostasia de Israel e a graça de Deus aos de fora” (CONSTABLE, 1985, p. 548).
Essa cura ultrapassa fronteiras. O milagre de Eliseu não apenas beneficia um estrangeiro, mas revela que o Deus de Israel está vivo e ativo — ainda que seu próprio povo o ignore.
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Por que Naamã buscou cura em Israel? (2 Reis 5:1–6)
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“Se o meu senhor procurasse o profeta que está em Samaria, ele o curaria da lepra” (2 Rs 5.3)
Naamã era leproso. Embora o termo hebraico tsara’at seja comumente traduzido por lepra, estudos modernos, como apontam Walton, Matthews e Chavalas (2018), indicam que a condição se referia a várias doenças de pele, como psoríase ou vitiligo, e não à hanseníase propriamente dita (WALTON et al., 2018, p. 507).
Curiosamente, a recomendação que o leva a buscar cura em Israel vem de uma jovem cativa, uma israelita escravizada em sua casa. Isso mostra como Deus pode usar até os humildes e esquecidos para realizar Seus propósitos. Isso me lembra como, em 1 Reis 17, Deus usou uma viúva em Sarepta para sustentar Elias — mostrando que os improváveis têm papel central na história da fé.
O rei da Síria imediatamente envia Naamã a Israel com uma carta de apresentação e um presente enorme — aproximadamente “350 quilos de prata, 72 de ouro e dez mudas de roupas finas” (v. 5). Segundo o Comentário Histórico-Cultural, esses valores representariam milhões em dinheiro atual, comparáveis ao resgate de um rei (WALTON et al., 2018, p. 507).
A carta endereçada ao rei de Israel cria um mal-entendido: em vez de procurar o profeta, Naamã busca cura no trono — algo que só Deus poderia fazer. O rei se desespera, vendo a carta como provocação e possível pretexto para guerra.
Ao ler isso, me pergunto: quantas vezes esperamos que soluções espirituais venham de autoridades humanas? O rei olha para si mesmo, mas Deus estava agindo por outro caminho — através de Seu profeta.
Por que Eliseu não recebe Naamã pessoalmente? (2 Reis 5:7–14)
“Vá e lave-se sete vezes no rio Jordão” (2 Rs 5.10)
Eliseu, ao saber da confusão, intervém. Ele pede que Naamã venha até sua casa, mas age de forma inesperada: não o recebe pessoalmente, nem realiza um ritual visível. Apenas envia uma ordem simples: mergulhar sete vezes no rio Jordão.
Isso frustra profundamente Naamã. Ele esperava um ritual solene, gestos, encantamentos, um espetáculo. Segundo o Comentário Histórico-Cultural da Bíblia, “a expectativa de Naamã reflete práticas rituais comuns de invocação, onde a presença do especialista era considerada essencial” (WALTON et al., 2018, p. 508).
O que Eliseu faz é intencional. Ele retira a atenção de si mesmo, conduzindo Naamã a uma fé que não depende de rituais, mas de obediência. O rio Jordão, considerado inferior aos rios de Damasco, se torna o palco de um milagre justamente por causa da fé.
Esse detalhe conecta-se com outras ações proféticas que envolvem obediência simples e fé ativa. Em 2 Reis 4, Eliseu mandou que a viúva enchesse vasilhas de azeite. Aqui, ele pede um banho no rio. O milagre não está no objeto, mas na obediência à Palavra de Deus.
Quando leio esse trecho, vejo um espelho da minha própria vida: quantas vezes Deus pede algo simples, mas meu orgulho complica tudo? Naamã precisou ser convencido por seus servos, os mesmos que antes ele liderava. Ao obedecer, foi curado — e sua pele restaurada como a de uma criança (v. 14).
Como Naamã expressou sua gratidão a Deus? (2 Reis 5:15–19)
“Agora sei que não há Deus em nenhum outro lugar, senão em Israel” (2 Rs 5.15)
Naamã volta transformado. Não só fisicamente, mas espiritualmente. Ele reconhece que o Senhor é o único Deus. Este é o clímax espiritual da narrativa. A cura foi apenas um meio para um fim maior: levar Naamã ao conhecimento do verdadeiro Deus.
Ele oferece presentes a Eliseu, mas o profeta recusa. Como observa Constable, “Eliseu não queria que o milagre fosse associado a pagamento. Ele agia sob a direção de Deus, não como um curandeiro que cobrava por seus serviços” (CONSTABLE, 1985, p. 548).
Naamã então pede para levar terra de Israel em duas mulas — o suficiente para construir um altar. Isso se relaciona à crença antiga de que um deus só podia ser adorado em sua própria terra. Mesmo que sua teologia ainda estivesse imatura, havia um coração sincero.
Naamã também pede perdão por uma concessão: teria que acompanhar seu rei em atos de culto a Rimom. Eliseu não o repreende diretamente, mas diz: “Vá em paz”. Talvez o profeta tenha deixado a consciência de Naamã amadurecer no tempo certo.
Essa parte me ensina algo precioso: a fé verdadeira começa com um coração grato. Naamã não recebeu apenas um novo corpo, mas uma nova identidade espiritual. Como aprendemos também em Apocalipse 21, o verdadeiro milagre é ser feito novo — por dentro e por fora.
Por que Geazi foi punido com lepra? (2 Reis 5:20–27)
“A lepra de Naamã atingirá você e os seus descendentes para sempre” (2 Rs 5.27)
Geazi, servo de Eliseu, vê na gratidão de Naamã uma oportunidade de lucro pessoal. Ele corre atrás do sírio, inventa uma história e recebe prata e roupas — escondendo tudo depois. Mas Deus vê o coração.
Quando Eliseu o confronta, Geazi mente. Mas o profeta sabe de tudo. Ele declara que não era momento para buscar prata, roupas, ou luxo. Como destaca Constable, “os verdadeiros profetas não devem lucrar com os milagres que Deus faz” (CONSTABLE, 1985, p. 549).
A lepra que foi tirada de Naamã agora se apega a Geazi. Um contraste drástico: o estrangeiro é purificado, o servo do profeta é contaminado.
Segundo Walton, “o castigo de Geazi era mais social do que físico; a lepra o isolaria da comunidade e traria vergonha pública” (WALTON et al., 2018, p. 509).
Esse trecho me desafia profundamente. Geazi conhecia o Deus de Israel, vivia com o profeta, mas escolheu mentir e se aproveitar. O risco da familiaridade com as coisas de Deus é cair na banalidade — e perder o temor.
Esse texto se conecta ao Novo Testamento?
Sim. Em Lucas 4.27, Jesus menciona exatamente esse episódio para mostrar como Deus agiu fora de Israel porque o povo rejeitava Sua voz. Isso provocou tanta ira nos ouvintes que eles tentaram matá-lo.
A graça de Deus ultrapassa fronteiras, mas também revela a dureza dos que têm acesso à verdade e a ignoram. Naamã, pagão, ouve e crê. Israel, povo de Deus, ignora e endurece.
Além disso, o contraste entre Eliseu e Geazi ecoa no ministério de Paulo, que constantemente rejeitava ofertas quando percebia que poderiam comprometer a mensagem (cf. 2 Co 11.7–9). A integridade ministerial é um valor eterno.
Quais aplicações práticas tiramos de 2 Reis 5 para hoje?
- Deus pode usar pessoas improváveis – A cativa israelita foi instrumento para a cura de um general sírio.
- Milagres têm um propósito espiritual maior – A cura levou Naamã ao conhecimento de Deus.
- Obediência simples libera poder sobrenatural – Naamã não foi curado pelo Jordão, mas pela fé em ação.
- A gratidão transforma a fé em adoração – Naamã não apenas foi curado, mas passou a adorar ao Senhor.
- A ganância destrói a vocação – Geazi trocou a bênção pelo lucro e pagou caro por isso.
- Integridade ministerial importa – Eliseu recusou qualquer glória ou benefício pessoal.
- A fé sincera pode nascer fora dos muros religiosos – Deus alcança corações sedentos, mesmo distantes.
- Deus resiste aos soberbos, mas exalta os humildes – Naamã precisou descer do orgulho para subir em fé.
Conclusão
2 Reis 5 é um retrato poderoso da graça de Deus. Ele alcança quem está longe, cura o impuro, transforma o coração e denuncia a hipocrisia religiosa. Eliseu age com fidelidade. Geazi, com falsidade. Naamã, com fé.
Ao ler essa história, sou lembrado de que o verdadeiro milagre não foi a pele restaurada — foi a fé despertada. Naamã voltou com o coração novo. Geazi ficou com a lepra que ele desprezou.
Como aprendemos em 2 Reis 1 e 2 Reis 4, Deus continua falando. A pergunta é: vamos obedecer ou resistir?
Referências
- CONSTABLE, Thomas L. 2 Kings. In: WALVOORD, J. F.; ZUCK, R. B. (Orgs.). The Bible Knowledge Commentary: An Exposition of the Scriptures. Vol. 1. Wheaton, IL: Victor Books, 1985. p. 546–549.
- WALTON, John H.; MATTHEWS, Victor H.; CHAVALAS, Mark W. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Antigo Testamento. Tradução de Noemi Valéria Altoé da Silva. 1. ed. São Paulo: Vida Nova, 2018. p. 507–509.
- Bíblia Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Sociedade Bíblica Internacional, 2001.

Sou Diego Nascimento e o Jesus e a Bíblia não é apenas um projeto, é um chamado. Deus deu essa missão a mim e a Carol (esposa) por meio do Espírito Santo. Amamos a Palavra de Deus e acreditamos que ela pode mudar a sua vida, assim como mudou a nossa.