2 Reis 18 marca uma nova fase na história de Judá. Enquanto o Reino do Norte, Israel, caminhava para sua destruição total pelas mãos da Assíria (2 Rs 17), Judá experimentava um raro período de renovação espiritual sob o governo de Ezequias. Ele começou a reinar por volta de 715 a.C., num cenário de intensa pressão política e militar, especialmente da parte dos assírios, que haviam destruído Samaria apenas alguns anos antes.
Ezequias reinou por 29 anos (2 Rs 18.2), sendo um dos poucos reis de Judá elogiados pelas Escrituras por seu compromisso com o Senhor: “Ele fez o que o Senhor aprova, tal como tinha feito Davi, seu predecessor” (2 Rs 18.3). Ele foi um reformador espiritual, rompendo com as práticas idólatras promovidas por seus antecessores, inclusive seu pai, Acaz, que havia se aliado à Assíria (2 Rs 16).
Segundo Thomas Constable, “o escritor de 2 Reis dedicou mais espaço e elogios a Ezequias do que a qualquer outro rei de Judá, com exceção de Salomão” (CONSTABLE, 1985, p. 572). Isso mostra a importância teológica de seu reinado como símbolo de fidelidade a Deus mesmo em tempos sombrios.
Quais foram as ações de Ezequias que revelaram sua fidelidade a Deus? (2 Reis 18:1–8)
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O texto começa destacando o perfil espiritual de Ezequias. Diferente da maioria dos reis anteriores, ele não apenas evitou a idolatria — ele a confrontou diretamente: “Removeu os altares idólatras, quebrou as colunas sagradas e derrubou os postes sagrados” (v. 4).
Um dos atos mais significativos foi a destruição da serpente de bronze, chamada Neustã. Essa figura, que originalmente havia sido usada por Moisés como instrumento de cura (Nm 21.8–9), havia se tornado um objeto de culto. “Até àquela época os israelitas lhe queimavam incenso” (v. 4). Ezequias percebeu que o povo estava idolatrando o símbolo e não o Deus por trás do milagre.
O Comentário Histórico-Cultural da Bíblia explica que o nome Neustã provavelmente é uma fusão dos termos hebraicos para “bronze” (nehoshet) e “serpente” (nahash), e que objetos como esse eram comuns em cultos pagãos da época, especialmente na Síria e em Canaã (WALTON; MATTHEWS; CHAVALAS, 2018, p. 525).
A fidelidade de Ezequias é reforçada pela afirmação do versículo 5: “Ezequias confiava no Senhor, o Deus de Israel. Nunca houve ninguém como ele entre todos os reis de Judá, nem antes nem depois dele”. Ele não apenas iniciou bem sua trajetória, como se manteve firme até o fim.
O que levou o rei da Assíria a ameaçar Jerusalém? (2 Reis 18:9–16)
Nos versículos seguintes, o autor alterna entre a fidelidade de Judá e o julgamento do Reino do Norte. Enquanto Ezequias buscava o Senhor, Israel era destruído pelos assírios: “Isto aconteceu porque os israelitas não obedeceram ao Senhor seu Deus” (v. 12). Esse contraste é intencional: mostra que há consequências claras tanto para a obediência quanto para a rebeldia.
Contudo, a fidelidade de Ezequias não o livrou dos desafios políticos. Em 701 a.C., Senaqueribe, rei da Assíria, invadiu Judá. Ezequias, que havia se rebelado contra a dominação assíria (v. 7), teve que lidar com um ataque direto. Ele tenta uma negociação: “Cometi um erro. Pára de atacar-me, e eu pagarei tudo que exigires” (v. 14).
Mesmo após pagar um pesado tributo — dez toneladas e meia de prata e uma tonelada e cinquenta quilos de ouro — o rei da Assíria não se satisfez (v. 14–16). Segundo o Comentário Histórico-Cultural, as inscrições assírias afirmam que Ezequias também foi forçado a enviar “suas filhas, concubinas, músicos, marfim e peles de elefantes” (WALTON; MATTHEWS; CHAVALAS, 2018, p. 526). Isso mostra como a submissão política não trouxe paz a Judá.
O que podemos aprender com o discurso intimidador do comandante assírio? (2 Reis 18:17–35)
O rei da Assíria envia três oficiais de alto escalão — o general, o oficial principal e o comandante de campo — para intimidar Jerusalém (v. 17). Eles se posicionam próximo ao aqueduto do açude superior, um local estratégico e visível, e começam a gritar contra o muro da cidade.
A retórica do comandante de campo é um exemplo de manipulação psicológica. Ele questiona: “Em que você baseia sua confiança?” (v. 19). E depois ridiculariza tanto o apoio militar do Egito quanto a fé em Deus: “Você está confiando no Egito, aquele caniço quebrado…?” (v. 21), “O próprio Senhor me disse que marchasse contra este país e o destruísse” (v. 25).
Constable destaca que “o comandante fazia uma mistura de meias verdades e mentiras para enfraquecer a moral do povo e forçar a rendição” (CONSTABLE, 1985, p. 574). Ele até mesmo interpreta erroneamente as reformas de Ezequias como afrontas a Deus, dizendo que ao remover os altares, ele teria provocado o Senhor (v. 22). Na verdade, essas reformas estavam em total acordo com a Lei de Moisés (Dt 12.2–7).
O ápice do discurso é um apelo direto ao povo: “Escolham a vida… cada um debaixo da sua videira e da sua figueira” (v. 31). A promessa de paz e abundância é falsa. O objetivo era quebrar a confiança em Ezequias e provocar a rendição sem resistência.
Esse episódio tem reflexos no Novo Testamento?
Sim. O tipo de ataque feito pelo comandante assírio lembra o modo como Satanás tentou Jesus no deserto, misturando verdades com mentiras para gerar dúvida (Mt 4.1–11). Ambos apelam à lógica humana, às necessidades físicas e à distorção da Palavra de Deus.
Além disso, o que vemos em 2 Reis 18 se repete na história da igreja. Em Atos 4, por exemplo, os apóstolos são intimidados a parar de pregar. A resposta deles é semelhante à de Ezequias: eles recorrem à oração e confiam em Deus.
Outro reflexo aparece em João 10, quando Jesus afirma que o verdadeiro pastor dá a vida pelas ovelhas, enquanto o mercenário foge diante do perigo. Ezequias não fugiu. Ele buscou o Senhor (veremos isso em detalhes no capítulo 19).
Que lições espirituais podemos tirar de 2 Reis 18?
- Fidelidade pessoal impacta uma geração – Ezequias foi fiel, mesmo vindo de uma linhagem corrompida por Acaz. Isso mostra que não somos reféns do passado. Podemos romper ciclos e iniciar algo novo com Deus.
- Reformas espirituais exigem coragem – Destruir a serpente de bronze não era popular. Mas Ezequias fez o que era certo. Às vezes, obedecer a Deus significa contrariar tradições que se tornaram ídolos.
- A confiança em Deus é mais poderosa que alianças humanas – O Egito parecia um bom aliado, mas era frágil. Confiar em Deus, mesmo sem recursos visíveis, é sempre a melhor escolha.
- As ameaças do inimigo são barulhentas, mas vazias diante de Deus – O comandante assírio gritou alto, mas não conhecia o poder do Deus de Judá. Muitas vezes, as ameaças que enfrentamos parecem maiores do que realmente são.
- Deus permanece soberano mesmo em tempos de tribulação – Mesmo cercado, Ezequias tinha acesso ao trono da graça. Como aprendemos em Salmos 46, “Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente na angústia”.
- O inimigo sempre tentará minar nossa identidade espiritual – Quando o comandante ridiculariza a fé de Judá, ele tenta destruir sua essência. Hoje, ainda enfrentamos vozes que tentam questionar nossa fé, nossos valores e nosso compromisso com Cristo.
- Nossa resposta à crise revela nosso coração – O silêncio do povo (v. 36), obedecendo à ordem de Ezequias, mostra sabedoria. Em tempos de confronto espiritual, saber ouvir mais do que reagir pode ser a maior prova de fé.
Conclusão
2 Reis 18 é mais do que um relato de guerra. É um testemunho de fé, coragem e fidelidade. Enquanto o mundo ao redor desmoronava, Ezequias escolheu confiar no Senhor. Suas reformas espirituais desafiaram a idolatria e restauraram a verdadeira adoração.
Mesmo diante de uma ameaça avassaladora, ele manteve os olhos em Deus. O silêncio diante do inimigo, a destruição dos ídolos, e a coragem de romper com alianças frágeis são lições poderosas para nós hoje.
Ao refletir nesse capítulo, lembro das palavras de Romanos 8.31: “Se Deus é por nós, quem será contra nós?”. A fidelidade de Ezequias não o livrou dos problemas, mas o sustentou em meio a eles. Que o mesmo aconteça conosco.
Referências
- CONSTABLE, Thomas L. 2 Kings. In: WALVOORD, J. F.; ZUCK, R. B. (Orgs.). The Bible Knowledge Commentary: An Exposition of the Scriptures. Vol. 1. Wheaton, IL: Victor Books, 1985. p. 572–575.
- WALTON, John H.; MATTHEWS, Victor H.; CHAVALAS, Mark W. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Antigo Testamento. Tradução de Noemi Valéria Altoé da Silva. 1. ed. São Paulo: Vida Nova, 2018. p. 525–526.
- Bíblia Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Sociedade Bíblica Internacional, 2001.

Sou Diego Nascimento e o Jesus e a Bíblia não é apenas um projeto, é um chamado. Deus deu essa missão a mim e a Carol (esposa) por meio do Espírito Santo. Amamos a Palavra de Deus e acreditamos que ela pode mudar a sua vida, assim como mudou a nossa.