1 Coríntios 1 é um dos capítulos mais confrontadores e, ao mesmo tempo, encorajadores do Novo Testamento. Ao ler esse texto, eu percebo como é fácil, mesmo dentro da igreja, nos deixarmos levar por divisões, orgulho e a busca por reconhecimento humano. Mas Paulo, com sabedoria e autoridade dadas por Deus, nos lembra que tudo o que temos e somos vem de Cristo. Ele expõe tanto os perigos do orgulho quanto a beleza da cruz, que parece loucura ao mundo, mas é o poder de Deus para aqueles que creem.
Qual é o contexto histórico e teológico de 1 Coríntios 1?
A carta aos Coríntios foi escrita pelo apóstolo Paulo por volta do ano 55 d.C., durante sua estadia em Éfeso, em sua terceira viagem missionária (Atos 19) (KEENER, 2017). Corinto era uma cidade próspera, estratégica e famosa por sua imoralidade. Localizada no istmo entre a Grécia continental e o Peloponeso, a cidade era um centro comercial e multicultural, marcada por influências gregas, romanas e orientais.
Corinto também era conhecida pela adoração a deuses pagãos, como Afrodite, e pela presença de templos luxuosos. A cidade reunia pessoas de todas as classes sociais, desde comerciantes ricos até escravos. Nesse ambiente, Paulo plantou uma igreja, formada por pessoas simples e alguns poucos influentes, como Crispo e Gaio.
A igreja em Corinto, apesar de abençoada com muitos dons espirituais, enfrentava sérios problemas: divisões internas, orgulho espiritual, imoralidade e disputas judiciais entre irmãos. Diante disso, Paulo escreve essa carta para corrigir erros e, ao mesmo tempo, reafirmar a identidade e o chamado dos cristãos coríntios.
Simon Kistemaker destaca que, entre todas as epístolas de Paulo, nenhuma aborda tantos temas pastorais e éticos como 1 Coríntios. Paulo trata desde a unidade da igreja até questões como o uso dos dons espirituais e a importância da ressurreição (KISTEMAKER, 2014, p. 51-92).
Como o texto de 1 Coríntios 1 se desenvolve?
1. Saudações e ação de graças (1 Coríntios 1.1-9)
Paulo inicia a carta lembrando sua autoridade apostólica: “Paulo, chamado para ser apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de Deus” (1.1). Ele não se apresenta como alguém que assumiu o ministério por vontade própria, mas como alguém chamado por Deus.
Interessante notar que ele inclui Sóstenes na saudação, possivelmente o mesmo líder da sinagoga em Corinto que se converteu (Atos 18.17). Isso já revela o tom pastoral e próximo da carta.
Em seguida, ele lembra aos coríntios quem eles são: “à igreja de Deus que está em Corinto, aos santificados em Cristo Jesus e chamados para serem santos” (1.2). Apesar dos problemas, Paulo não nega a identidade deles como povo de Deus.
Ele agradece a Deus pela graça derramada sobre eles: “Pois nele vocês foram enriquecidos em tudo, em toda palavra e em todo conhecimento” (1.5). Mesmo uma igreja cheia de conflitos possuía dons e potencial espiritual, o que revela a paciência e a fidelidade de Deus.
Paulo conclui essa seção afirmando que Deus os sustentará até o fim e os tornará irrepreensíveis no dia do Senhor (1.8). É reconfortante lembrar que, mesmo em meio às falhas humanas, Deus permanece fiel (1.9).
2. O problema das divisões na igreja (1 Coríntios 1.10-17)
Depois da saudação carinhosa, Paulo aborda de forma direta o problema das divisões. Ele suplica: “que não haja divisões entre vocês, mas que todos estejam unidos num só pensamento e num só parecer” (1.10).
Através de relatos vindos da casa de Cloe, ele ficou sabendo que os cristãos estavam se dividindo em partidos: “Eu sou de Paulo”, “eu de Apolo”, “eu de Pedro”, “eu de Cristo” (1.12). Essas facções revelavam um espírito de orgulho e partidarismo.
Paulo confronta o absurdo dessa situação com perguntas retóricas: “Acaso Cristo está dividido? Foi Paulo crucificado em favor de vocês?” (1.13). Ele lembra que ninguém deve se exaltar a ponto de formar grupos rivais dentro da igreja.
Com humildade, ele até agradece por ter batizado poucas pessoas, para que ninguém dissesse que foram batizados em seu nome (1.14-16). Ele reforça que sua missão principal era pregar o evangelho, não criar seguidores pessoais (1.17).
Keener explica que, no contexto da cultura grega, havia grande valorização de oradores carismáticos e mestres influentes. Isso pode ter contribuído para o espírito de partidarismo entre os coríntios (KEENER, 2017).
3. A loucura da cruz e o poder de Deus (1 Coríntios 1.18-25)
Paulo então apresenta o contraste central entre a sabedoria do mundo e a sabedoria de Deus. “Pois a mensagem da cruz é loucura para os que estão perecendo, mas para nós, que estamos sendo salvos, é o poder de Deus” (1.18).
Ele cita o Antigo Testamento para mostrar que Deus já havia prometido confundir a sabedoria humana (1.19, cf. Isaías 29.14). Os filósofos e eruditos da época desprezavam a mensagem da cruz, mas ela continua sendo o meio pelo qual Deus salva.
“Visto que, na sabedoria de Deus, o mundo não o conheceu por meio da sabedoria humana, agradou a Deus salvar aqueles que crêem por meio da loucura da pregação” (1.21).
Os judeus buscavam sinais miraculosos, os gregos buscavam sabedoria, mas Deus ofereceu Cristo crucificado — escândalo para uns, loucura para outros (1.22-23).
Porém, para os que foram chamados, Cristo é o poder e a sabedoria de Deus (1.24). Paulo afirma de forma irônica: “a loucura de Deus é mais sábia que a sabedoria humana, e a fraqueza de Deus é mais forte que a força do homem” (1.25).
Simon Kistemaker destaca que, para o mundo antigo, um Messias crucificado era algo inconcebível. Mas Deus, em sua soberania, inverteu as expectativas humanas e revelou seu poder na cruz (KISTEMAKER, 2014, p. 79-92).
4. Deus escolhe os fracos para envergonhar os fortes (1 Coríntios 1.26-31)
Paulo convida os coríntios a refletirem sobre o próprio chamado: “Poucos eram sábios segundo os padrões humanos; poucos eram poderosos; poucos eram de nobre nascimento” (1.26). A maioria deles era gente simples, sem influência social.
Mas Deus fez questão de escolher “as coisas loucas do mundo para envergonhar os sábios, e as coisas fracas para envergonhar as fortes” (1.27). Ele escolheu o que é insignificante e desprezado, para anular aquilo que o mundo considera importante (1.28).
O objetivo disso é claro: “para que ninguém se vanglorie diante dele” (1.29). Ninguém pode dizer que foi salvo por mérito próprio.
Paulo então conclui afirmando que “por iniciativa dele vocês estão em Cristo Jesus, o qual se tornou sabedoria de Deus para nós: justiça, santidade e redenção” (1.30). Em Cristo, temos tudo o que precisamos.
Por isso, como diz a Escritura: “Quem se gloriar, glorie-se no Senhor” (1.31, cf. Jeremias 9.24).
Que conexões proféticas encontramos em 1 Coríntios 1?
Esse capítulo revela o cumprimento da promessa de Deus de frustrar a sabedoria humana e exaltar o humilde, como anunciado pelos profetas do Antigo Testamento (Isaías 29.14; Jeremias 9.24).
A rejeição de Cristo pela maioria dos judeus, por ele não corresponder às expectativas de um Messias poderoso e glorioso, também cumpre as profecias sobre o Servo Sofredor (Isaías 53).
A cruz, escândalo para uns e loucura para outros, é o centro da revelação messiânica. Através dela, Deus cumpre seu plano de salvação e revela a verdadeira sabedoria.
Além disso, o chamado de Deus a pessoas simples, sem influência ou status, aponta para o padrão constante de Deus ao longo das Escrituras: Ele usa os pequenos para realizar grandes coisas. Assim como fez com Abraão, Davi e os profetas, Ele continua chamando pessoas comuns para o extraordinário.
O que 1 Coríntios 1 me ensina para a vida hoje?
Esse texto me confronta e me consola ao mesmo tempo. Ele me lembra que a fé cristã não é sobre status, inteligência ou aparência. Deus escolhe os fracos, os humildes, os desprezados — e é exatamente aí que me encaixo.
Aprendo que:
- Não devo buscar reconhecimento humano dentro da igreja, mas promover a unidade.
- Preciso rejeitar o orgulho e o partidarismo, lembrando que só Cristo é digno de exaltação.
- A cruz de Cristo continua sendo escândalo para muitos, mas é o poder de Deus para minha salvação.
- Deus usa a fraqueza humana para demonstrar sua força. Não preciso esconder minhas limitações.
- Tudo o que tenho — sabedoria, justiça, santidade e redenção — vem de Cristo. Não há motivo para vanglória pessoal.
Esse capítulo também me alerta sobre o perigo de buscar a sabedoria do mundo, esquecendo-me da simplicidade do evangelho. O que o mundo considera loucura, Deus chama de poder.
Como 1 Coríntios 1 me conecta ao restante das Escrituras?
1 Coríntios 1 se encaixa perfeitamente na revelação bíblica. Ele ecoa o padrão divino revelado desde o Antigo Testamento: Deus escolhe o improvável, confunde os sábios, derruba os poderosos e exalta os humildes.
Ele aponta para o centro da fé cristã — a cruz de Cristo — e mostra como Deus, em sua sabedoria, transforma aquilo que o mundo despreza em instrumento de salvação.
Além disso, o chamado à unidade e à humildade é reforçado em toda a Bíblia, desde os Salmos até os ensinos de Jesus e as cartas apostólicas.
Esse capítulo me lembra que a igreja de Cristo, em qualquer tempo ou lugar, precisa lutar contra divisões e se render ao poder e à sabedoria de Deus, expressos de forma mais profunda na cruz.
Referências
- KISTEMAKER, Simon. 1 Coríntios. 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2014.
- KEENER, Craig S. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Novo Testamento. Tradução: José Gabriel Said. Edição Ampliada. São Paulo: Vida Nova, 2017.
- Bíblia Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Sociedade Bíblica Internacional, 2001.

Sou Diego Nascimento e o Jesus e a Bíblia não é apenas um projeto, é um chamado. Deus deu essa missão a mim e a Carol (esposa) por meio do Espírito Santo. Amamos a Palavra de Deus e acreditamos que ela pode mudar a sua vida, assim como mudou a nossa.