Hebreus 2 é um dos capítulos mais preciosos para entendermos a humanidade de Cristo e a profundidade do seu sacrifício por nós. Sempre que leio esse texto, fico impressionado com o cuidado pastoral do autor de Hebreus. Ele não fala apenas como teólogo, mas como alguém que ama as pessoas e deseja vê-las firmes na fé. Nesse capítulo, somos convidados a prestar atenção, lembrar da grandeza da salvação e confiar em Jesus, que, sendo Deus, se fez homem para nos salvar.
Qual é o contexto histórico e teológico de Hebreus 2?
A Epístola aos Hebreus foi escrita para cristãos judeus que estavam enfrentando grandes desafios. Provavelmente viviam em Roma ou em outra cidade influente do Império Romano. Eles sofriam perseguições e tinham a tentação de abandonar a fé em Jesus para voltar ao judaísmo tradicional, mais aceito socialmente.
Esses irmãos conheciam profundamente o Antigo Testamento, os Salmos e as tradições sobre os anjos. Por isso, o autor constrói sua argumentação de forma muito cuidadosa. Primeiro, no capítulo 1, ele deixa claro que Jesus é superior aos anjos. Em seguida, no capítulo 2, ele mostra que essa superioridade não diminui a humanidade de Cristo, pelo contrário: foi necessário que Ele se tornasse homem, semelhante a nós, para nos salvar.
Craig Keener explica que, naquela época, alguns judeus-cristãos eram tentados a ver Jesus apenas como um anjo exaltado, o que parecia mais aceitável para suas comunidades judaicas. Hebreus responde diretamente a esse erro, mostrando que Jesus é infinitamente maior do que qualquer anjo, pois é o Filho de Deus, mas também verdadeiramente humano (KEENER, 2017).
Simon Kistemaker destaca que, além de apresentar a superioridade de Cristo, o autor de Hebreus age como um pastor atento. Ele não quer apenas ensinar doutrina, mas exortar os leitores a não se desviarem da fé, a não negligenciarem a tão grande salvação (KISTEMAKER, 2013).
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Teologicamente, Hebreus 2 aprofunda o tema do capítulo anterior. Jesus, que é exaltado acima dos anjos, também se humilhou ao se tornar homem, sofrer e morrer. Essa humilhação não diminui sua glória, pelo contrário: foi através dela que Ele conquistou nossa salvação.
Como o texto de Hebreus 2 se desenvolve?
1. Por que devemos prestar atenção à mensagem? (Hebreus 2.1-4)
O capítulo começa com uma exortação muito prática:
“Por isso é preciso que prestemos maior atenção ao que temos ouvido, para que jamais nos desviemos.” (Hebreus 2.1)
O autor está dizendo que, diante da grandeza de Cristo e da importância do evangelho, não podemos ser negligentes. A imagem aqui é de um barco que, por descuido, se afasta do porto. Se não prestarmos atenção, podemos nos desviar da fé, sem nem perceber.
Eu confesso que esse versículo sempre me faz refletir sobre como é fácil se distrair espiritualmente. Com o tempo, a gente corre o risco de ir deixando a Palavra de lado, os cultos, a oração… e, quando vê, já está longe da presença de Deus.
O autor continua:
“Porque se a mensagem transmitida por anjos provou a sua firmeza, e toda transgressão e desobediência recebeu a devida punição, como escaparemos nós, se negligenciarmos tão grande salvação?” (Hebreus 2.2-3a)
Aqui ele faz um argumento típico do pensamento judaico, chamado qal wahomer, ou seja, “quanto mais…”. Se a lei transmitida por anjos no Monte Sinai foi tão séria, quanto mais o evangelho anunciado pelo próprio Senhor!
Keener observa que, no judaísmo, acreditava-se que os anjos participaram da entrega da lei a Moisés (Atos 7.53; Gálatas 3.19). Logo, a mensagem que veio diretamente de Jesus tem um peso ainda maior (KEENER, 2017).
A “grande salvação” não foi apenas um ensinamento bonito, mas um plano divino, iniciado por Cristo, confirmado pelos apóstolos e autenticado por sinais e milagres:
“Essa salvação, primeiramente anunciada pelo Senhor, foi-nos confirmada pelos que a ouviram. Deus também deu testemunho dela por meio de sinais, maravilhas, diversos milagres e dons do Espírito Santo distribuídos de acordo com a sua vontade.” (Hebreus 2.3b-4)
Simon Kistemaker destaca que esses sinais e milagres foram especialmente abundantes no início da igreja, como podemos ver em Atos 2, confirmando a veracidade da mensagem (KISTEMAKER, 2013).
2. Quem dominará o mundo porvir? (Hebreus 2.5-9)
Depois da exortação, o autor volta ao tema da superioridade de Cristo e usa o Salmo 8 para falar sobre o destino do homem:
“Não foi a anjos que ele sujeitou o mundo que há de vir, a respeito do qual estamos falando, mas alguém em certo lugar testemunhou, dizendo: ‘Que é o homem, para que com ele te importes? E o filho do homem, para que com ele te preocupes?'” (Hebreus 2.5-6)
O “mundo que há de vir” aponta para a era messiânica, inaugurada por Jesus. Esse mundo não está sujeito aos anjos, mas ao homem, e, de forma especial, ao próprio Cristo, que é o novo Adão.
O Salmo 8 fala da dignidade do ser humano, criado por Deus “um pouco menor do que os anjos” e coroado de “glória e honra” (Hebreus 2.7).
No entanto, sabemos que, por causa do pecado, o homem perdeu esse domínio. Ainda não vemos todas as coisas sujeitas ao homem, mas vemos Jesus:
“Vemos, todavia, aquele que por um pouco foi feito menor do que os anjos, Jesus, coroado de honra e glória por ter sofrido a morte, para que, pela graça de Deus, em favor de todos, experimentasse a morte.” (Hebreus 2.9)
Kistemaker explica que Jesus se fez homem, assumiu nossa fragilidade, sofreu e morreu. Mas, por causa dessa obediência, foi exaltado e agora reina. Ele cumpriu o propósito original do homem, perdido por Adão (KISTEMAKER, 2013).
O uso do nome “Jesus” aqui destaca sua humanidade. Ele, sendo Deus, se humilhou, viveu entre nós, sofreu e venceu a morte.
3. Quem são os irmãos de Jesus? (Hebreus 2.10-13)
O autor aprofunda o tema da identificação de Cristo com os seres humanos:
“Ao levar muitos filhos à glória, convinha que Deus, por causa de quem e por meio de quem tudo existe, tornasse perfeito, mediante o sofrimento, o autor da salvação deles.” (Hebreus 2.10)
Jesus é o “autor da salvação”, o pioneiro, aquele que abriu o caminho para nós. Ele sofreu, foi aperfeiçoado em sua missão, e agora conduz muitos filhos à glória.
Essa expressão “muitos filhos” aponta para nós, os crentes. Jesus nos chama de irmãos:
“Tanto o que faz os homens santos como aqueles que são feitos santos são da mesma família. Assim, Jesus não se envergonha de chamá-los de irmãos.” (Hebreus 2.11)
Eu sempre fico tocado com essa verdade. Jesus, o Filho de Deus, me chama de irmão. Ele não tem vergonha de se identificar comigo. E Ele mesmo declarou, como diz o Salmo 22:
“Eu declararei teu nome aos meus irmãos; na presença da congregação eu cantarei teus louvores.” (Hebreus 2.12)
Keener lembra que esse salmo, usado nos evangelhos, fala do sofrimento e da vitória do justo sofredor. Jesus o cumpre plenamente (KEENER, 2017).
4. Por que Jesus precisou se tornar humano? (Hebreus 2.14-18)
A explicação fica ainda mais clara nos versículos finais:
“Visto que os filhos têm carne e sangue, ele também participou dessa condição humana, para que, por sua morte, derrotasse aquele que tem o poder da morte, isto é, o diabo.” (Hebreus 2.14)
Jesus se fez homem para poder morrer. E, por meio da morte, venceu Satanás e libertou os que estavam presos pelo medo da morte.
Eu vejo o quanto isso é atual. Quantas pessoas vivem escravizadas pelo medo? Medo de morrer, medo do futuro, medo do castigo de Deus. Jesus veio para nos libertar desse medo.
O texto continua:
“Pois, certamente, não é a anjos que ele ajuda, mas aos descendentes de Abraão.” (Hebreus 2.16)
Jesus não veio para socorrer anjos, mas seres humanos. E não qualquer ser humano, mas aqueles que creem, os descendentes espirituais de Abraão (Gálatas 3.29).
Por isso Ele se fez semelhante a nós em tudo, menos no pecado, para ser nosso sumo sacerdote:
“Por essa razão era necessário que ele se tornasse semelhante a seus irmãos em todos os aspectos, para se tornar um sumo sacerdote misericordioso e fiel com relação a Deus, e fazer propiciação pelos pecados do povo.” (Hebreus 2.17)
Jesus entende as nossas fraquezas. Ele sofreu, foi tentado, mas venceu. E hoje pode nos socorrer:
“Porque, tendo em vista o que ele mesmo sofreu quando tentado, ele é capaz de socorrer aqueles que também estão sendo tentados.” (Hebreus 2.18)
Essa é uma das maiores consolações da fé cristã. Quando estou sendo tentado, quando me sinto fraco, sei que posso correr até Jesus. Ele sabe o que estou sentindo e tem poder para me ajudar.
Que conexões proféticas encontramos em Hebreus 2?
Hebreus 2 está repleto de conexões com o Antigo Testamento. O Salmo 8 fala do propósito original de Deus para o homem, cumprido por Cristo. O Salmo 22 revela o sofrimento e a exaltação do Messias. Isaías 8 destaca a confiança do justo e a presença de Deus no meio do seu povo.
Além disso, o tema do sumo sacerdote aponta diretamente para o sistema sacrificial do Antigo Testamento, agora cumprido em Cristo. Ele é o verdadeiro mediador entre Deus e os homens.
O que Hebreus 2 me ensina para a vida hoje?
Hebreus 2 fala muito ao meu coração. Ele me lembra que:
- Jesus me chama de irmão e se identifica comigo.
- Ele sabe o que é sofrer, ser tentado, sentir fraqueza.
- Cristo venceu o diabo e me libertou do medo da morte.
- Não posso negligenciar a salvação. Preciso levar minha fé a sério.
- Quando sou tentado ou desanimado, posso correr até Jesus. Ele entende e socorre.
Que esse texto nos leve a valorizar ainda mais nossa salvação e a confiar em Jesus, nosso irmão, Salvador e Sumo Sacerdote.
Referências
- KISTEMAKER, Simon. Hebreus. 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2013.
- KEENER, Craig S. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Novo Testamento. Tradução: José Gabriel Said. Edição Ampliada. São Paulo: Vida Nova, 2017.
- Bíblia Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Sociedade Bíblica Internacional, 2001.