Gênesis 19 relata um dos episódios mais dramáticos e conhecidos das Escrituras: o juízo sobre Sodoma e Gomorra. Esse capítulo continua o fluxo narrativo iniciado em Gênesis 18, quando Abraão intercede pelas cidades, e Deus revela que irá investigar a gravidade do pecado ali.
O livro de Gênesis, escrito por Moisés por volta do século XV ou XIII a.C., tem como propósito apresentar as origens da criação, da humanidade e do povo de Deus. O capítulo 19 revela a justiça e a misericórdia divina em meio ao pecado humano.
Historicamente, as cidades de Sodoma e Gomorra faziam parte das “cidades da planície”, localizadas ao redor do Mar Morto, provavelmente em sua extremidade sul, conforme sugerem pesquisas arqueológicas sobre Bad-edh Dhra’ e Numeira (WALTON; MATTHEWS; CHAVALAS, 2018).
Culturalmente, Sodoma prosperava graças aos depósitos de sal, betume e potássio, além do comércio que passava pela região. Contudo, essa prosperidade material contrastava com sua decadência moral. O texto bíblico destaca Sodoma como símbolo máximo da depravação e da injustiça.
Teologicamente, Gênesis 19 reforça o padrão divino de agir: Deus investiga antes de julgar (Gn 18.20-21), oferece misericórdia aos justos (Gn 19.16), mas executa juízo sobre o pecado sem arrependimento. Como Waltke e Fredericks (2010) apontam, a narrativa também ilustra o contraste entre a hospitalidade justa e a perversão sexual, temas centrais no Antigo Testamento.
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Além disso, o episódio marca a origem de dois povos importantes na história de Israel: moabitas e amonitas, fruto do drama final envolvendo Ló e suas filhas.
Como o texto de Gênesis 19 se desenvolve?
O capítulo pode ser dividido em três grandes blocos:
1. A visita dos anjos e o comportamento dos sodomitas (Gênesis 19.1-11)
Os dois anjos chegam a Sodoma ao anoitecer, e Ló, que estava à porta da cidade, os recebe (Gn 19.1). Estar à porta indica seu papel de liderança na cidade, possivelmente como juiz ou ancião, embora sua moral ainda estivesse alinhada aos valores de Abraão, e não dos sodomitas (WALTKE; FREDERICKS, 2010).
Ló oferece hospitalidade aos visitantes, insistindo para que fiquem em sua casa (Gn 19.2-3). Esse gesto reflete o antigo valor de proteger hóspedes, o que incluía assumir total responsabilidade por sua segurança (WALTON; MATTHEWS; CHAVALAS, 2018).
Porém, a situação rapidamente se agrava. Todos os homens da cidade, dos mais jovens aos mais velhos, cercam a casa e exigem que os visitantes sejam entregues para serem violentados sexualmente (Gn 19.4-5). O termo “conhecer” aqui é usado em seu sentido sexual, como em outros trechos do Antigo Testamento.
A perversidade do povo de Sodoma não se limita ao desejo homossexual, mas envolve estupro coletivo e abuso extremo, configurando um quadro de corrupção moral completa (WALTKE; FREDERICKS, 2010).
Ló tenta proteger os hóspedes, chegando a oferecer suas próprias filhas virgens, o que revela tanto o valor da hospitalidade quanto sua trágica perda de discernimento moral ao se aproximar demais dos valores da cidade (Gn 19.6-8).
A turba rejeita Ló e tenta invadir a casa, mas os anjos intervêm, cegando os homens e impedindo o ataque (Gn 19.9-11). Aqui vemos, mais uma vez, a graça e o poder protetor de Deus em ação.
2. O livramento de Ló e a destruição das cidades (Gênesis 19.12-29)
Os anjos ordenam a Ló que reúna sua família e saia imediatamente, pois a cidade será destruída (Gn 19.12-13). Ló tenta convencer seus genros, mas eles o consideram um brincalhão e ignoram o aviso (Gn 19.14).
Na manhã seguinte, Ló ainda hesita, e os anjos literalmente o tiram pela mão, junto com sua esposa e filhas, devido à misericórdia divina (Gn 19.15-16). Aqui fica claro que a salvação de Ló não foi por mérito, mas pela graça de Deus, como ressalta Waltke (2010).
Eles recebem a ordem de fugir sem olhar para trás, mas Ló, apegado à vida urbana, pede para se refugiar em Zoar, uma pequena cidade próxima. Mesmo diante de sua fé vacilante, Deus o atende, poupando Zoar (Gn 19.17-22).
Então o juízo se cumpre: fogo e enxofre caem dos céus sobre Sodoma e Gomorra, destruindo completamente a região (Gn 19.23-25). Possivelmente, como sugerem os estudiosos, o evento envolveu terremotos, gases inflamáveis e betume, fenômenos comuns na região do Mar Morto (WALTON; MATTHEWS; CHAVALAS, 2018).
A mulher de Ló, ao olhar para trás, desobedece à ordem divina e se transforma numa coluna de sal (Gn 19.26). Isso simboliza tanto sua saudade da vida pecaminosa quanto o juízo sobre quem se apega ao que Deus rejeitou.
Por fim, Abraão, de longe, observa a destruição e vê a fumaça subindo, como de uma fornalha (Gn 19.27-28). Deus havia lembrado de Abraão ao poupar Ló, reafirmando o impacto da intercessão do patriarca (Gn 19.29).
3. O episódio incestuoso e o nascimento de Moabe e Amom (Gênesis 19.30-38)
Ló, com medo de permanecer em Zoar, refugia-se nas montanhas com suas filhas e vive numa caverna (Gn 19.30). A ironia é evidente: ele havia temido as montanhas antes, agora se vê obrigado a morar nelas, num estado de miséria e isolamento.
As filhas de Ló, desesperadas pela falta de homens para preservar a linhagem familiar, embebedam o pai e mantêm relações sexuais com ele sem o seu conhecimento (Gn 19.31-33). Ambas engravidam, e assim nascem Moabe e Ben-Ami, ancestrais dos moabitas e amonitas (Gn 19.34-38).
Esse relato, embora escandaloso, explica as origens desses dois povos, que, apesar de seu nascimento questionável, tiveram um papel importante na história bíblica. Vale lembrar que, da linhagem moabita, viria Rute, e dela, o Messias Jesus (WALTKE; FREDERICKS, 2010).
Que conexões proféticas encontramos em Gênesis 19?
O juízo sobre Sodoma e Gomorra é frequentemente usado no restante das Escrituras como exemplo do castigo divino sobre a impiedade. Jesus mencionou o episódio ao advertir sobre o dia do juízo (Lucas 17.28-32). Ele alerta que, assim como o povo de Sodoma vivia despreocupado antes da destruição, muitos estarão alheios antes de sua segunda vinda.
Além disso, o Novo Testamento interpreta Sodoma como símbolo da corrupção moral extrema e do juízo inevitável (2 Pedro 2.6; Judas 7). Esses textos reforçam a seriedade com que Deus lida com o pecado coletivo e impenitente.
Outro aspecto profético é a figura de Ló. Embora imperfeito e vacilante, ele é descrito como justo em 2 Pedro 2.7-8. Isso aponta para a graça divina que alcança os pecadores arrependidos, mesmo que com fé fraca.
O nascimento de Moabe e Amom também tem implicações messiânicas. Da linhagem moabita viria Rute, bisavó do rei Davi (Rute 4.13-22), o que liga o episódio de Gênesis 19 à genealogia de Jesus (Mateus 1.5-6).
Por fim, a destruição de Sodoma ecoa no Apocalipse 21, onde a cidade corrompida é substituída pela nova Jerusalém, a morada dos justos.
O que Gênesis 19 me ensina para a vida hoje?
Esse texto fala profundamente comigo. Ao ler Gênesis 19, vejo o quanto o pecado corrompe, cega e destrói. Sodoma representa o que acontece quando a humanidade rejeita os padrões de Deus e segue seus próprios desejos.
Sou lembrado de que a hospitalidade e a justiça são marcas do povo de Deus. Ló, mesmo imperfeito, preservava esses valores em meio a uma sociedade corrompida. Em um mundo como o nosso, tão relativista e egoísta, preciso praticar a bondade e proteger os vulneráveis.
Também aprendo que o juízo de Deus é real e inevitável. Às vezes, achamos que Ele demora, mas o texto mostra que, no tempo certo, Ele age com justiça. Isso deve me levar ao arrependimento e à vigilância.
A hesitação de Ló me confronta. Quantas vezes, como ele, reluto em obedecer de imediato? Deus oferece livramento, mas muitas vezes meu apego ao conforto ou ao pecado me paralisa. Preciso confiar mais, agir rápido diante da direção divina.
O olhar para trás da esposa de Ló me faz pensar nas vezes que me apego ao passado, ao que Deus já pediu que eu deixasse. Isso só traz esterilidade e perda.
Por fim, o drama de Ló e suas filhas me mostra que decisões sem fé, guiadas pelo medo e pela autossuficiência, geram consequências duradouras. Em vez de seguir “o costume de toda a terra” (Gn 19.31), devo seguir a direção de Deus.
Como Gênesis 19 me conecta ao restante das Escrituras?
Gênesis 19 não é um texto isolado. Ele ecoa e se conecta com diversas partes da Bíblia:
- Assim como Deus julgou Sodoma, Ele julgará o mundo (Lucas 17.28-30).
- O livramento de Ló revela a misericórdia divina, como o livramento de Noé no dilúvio (Gênesis 6-8).
- A destruição das cidades aponta para o juízo final e o estabelecimento de um novo céu e nova terra (Apocalipse 21).
- A origem de Moabe e Amom, mesmo marcada pelo pecado, faz parte do plano redentor de Deus, culminando em Cristo.
Ao ler esse capítulo, entendo que a Bíblia é uma grande narrativa de justiça, graça e redenção, onde até as histórias mais trágicas apontam para a soberania e a fidelidade de Deus.
Referências
- WALTKE, Bruce K.; FREDERICKS, Cathi J. Gênesis. Organização: Cláudio Antônio Batista Marra. Tradução: Valter Graciano Martins. 1. ed. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2010.
- WALTON, John H.; MATTHEWS, Victor H.; CHAVALAS, Mark W. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Antigo Testamento. Tradução: Noemi Valéria Altoé da Silva. 1. ed. São Paulo: Vida Nova, 2018.
- Bíblia Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Sociedade Bíblica Internacional, 2001.

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