Gênesis 6 marca um dos momentos mais sombrios e, ao mesmo tempo, mais reveladores das Escrituras. Quando leio esse texto, percebo o quanto o pecado afeta não só o ser humano, mas toda a criação. Ao mesmo tempo, vejo a graça de Deus preservando a vida e a esperança em meio ao caos. É um capítulo que fala de juízo, mas também de aliança, e aponta diretamente para Cristo.
Qual é o contexto histórico e teológico de Gênesis 6?
O livro de Gênesis foi escrito por Moisés, provavelmente durante o período do êxodo ou logo após, entre os séculos XV e XIII a.C., como entendem os estudiosos conservadores. Esse capítulo faz parte do que os estudiosos chamam de “história primeva”, ou seja, os relatos que explicam as origens da humanidade e do mundo, antes da chamada de Abraão.
O pano de fundo cultural desse capítulo dialoga com o imaginário do antigo Oriente Próximo. Civilizações como os mesopotâmicos, egípcios e cananeus possuíam suas narrativas sobre a origem dos homens, os deuses e os grandes desastres, como o dilúvio. Mas a narrativa bíblica se destaca. Enquanto os mitos antigos falam de deuses caprichosos e egoístas, em Gênesis 6 o Criador age com justiça diante do mal e com graça ao preservar a humanidade.
Como destaca Walton, Matthews e Chavalas (2018), a linguagem sobre “filhos de Deus” e o próprio relato do dilúvio encontram ecos em textos antigos como a Epopeia de Gilgamesh ou de Atrahasis. Porém, a teologia bíblica transforma esses elementos, apresentando um Deus soberano, justo e misericordioso.
Waltke e Fredericks (2010) ressaltam que Gênesis 6 representa uma escalada do pecado após a queda e o assassinato de Abel. Aqui vemos a humanidade completamente corrompida, a ponto de Deus anunciar o juízo. Mas também encontramos Noé, o justo, preservado pela aliança divina.
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Teologicamente, o capítulo revela o impacto profundo do pecado na criação e a graça de Deus ao estabelecer a aliança com Noé, apontando para o propósito de redenção.
Como o texto de Gênesis 6 se desenvolve? (Gênesis 6.1-22)
O capítulo pode ser dividido em três grandes momentos: a corrupção da humanidade (v. 1-7), o favor de Noé (v. 8-12) e as instruções para a preservação da vida (v. 13-22).
A corrupção generalizada da humanidade (Gênesis 6.1-7)
O texto começa descrevendo:
“Quando os homens começaram a multiplicar-se na terra e lhes nasceram filhas” (Gênesis 6.1).
Esse crescimento populacional é acompanhado de degradação moral. O versículo 2 menciona:
“Os filhos de Deus viram que as filhas dos homens eram bonitas e escolheram para si aquelas que lhes agradaram”.
Há muita discussão sobre quem são esses “filhos de Deus”. Segundo Walton, Matthews e Chavalas (2018), essa expressão pode se referir a seres celestiais, como em outros textos do Antigo Testamento (Jó 1.6; 2.1), ou a reis e governantes humanos que, no contexto do antigo Oriente Próximo, eram considerados representantes divinos. Uma terceira possibilidade, defendida por Waltke e Fredericks (2010), é que o texto se refira a tiranos demonizados, homens possuídos ou inspirados por poderes malignos.
Seja qual for a interpretação, o fato é que há aqui uma violação dos limites estabelecidos por Deus, especialmente em relação à sexualidade e ao poder. O verbo “escolheram para si” reflete desejo egoísta e abuso, semelhante ao padrão do pecado em Gênesis 3.6.
O versículo 3 expressa o juízo de Deus:
“Por causa da perversidade do homem, meu Espírito não contenderá com ele para sempre; e ele só viverá cento e vinte anos”.
Esse limite de 120 anos, como observa Walton (2018), pode indicar o tempo restante até o dilúvio, e não uma expectativa de vida individual, considerando que pessoas como Noé viveram mais de 120 anos.
O versículo 4 menciona os nefilins, termo que, segundo Waltke e Fredericks (2010), pode se referir a guerreiros valentes ou figuras tirânicas do passado. Não se trata necessariamente de gigantes, mas de homens famosos, reconhecidos por sua força ou dominação.
A corrupção atinge o ápice quando Deus vê que “toda a inclinação dos pensamentos do seu coração era sempre e somente para o mal” (v. 5). A reação divina é descrita em linguagem humana:
“O Senhor arrependeu-se de ter feito o homem sobre a terra; e isso cortou-lhe o coração” (v. 6).
Esse “arrependimento” não indica mudança de caráter em Deus, mas expressa sua profunda tristeza diante do pecado, como explicam Waltke e Fredericks (2010).
O juízo é inevitável:
“Farei desaparecer da face da terra o homem que criei” (v. 7).
Mas mesmo em meio ao anúncio de destruição, surge a esperança: “A Noé, porém, o Senhor mostrou benevolência” (v. 8).
O favor e a justiça de Noé (Gênesis 6.8-12)
O versículo 9 apresenta o contraste:
“Noé era homem justo, íntegro entre o povo da sua época; ele andava com Deus”.
Aqui vejo como a fé e a obediência podem destacar alguém em meio à corrupção. Noé não era perfeito, mas se distinguia por sua integridade e comunhão com Deus. Waltke (2010) destaca que justiça aqui envolve tanto comportamento ético quanto fidelidade espiritual.
Noé tem três filhos: Sem, Cam e Jafé, que se tornarão os ancestrais dos povos pós-diluvianos.
O versículo 11 descreve a situação da terra:
“Ora, a terra estava corrompida aos olhos de Deus e cheia de violência”.
O termo “corrompida” implica degradação moral e social, enquanto “violência” (ḥāmās) envolve opressão, exploração e brutalidade. Deus vê toda a criação em ruína, fruto do pecado humano.
As instruções para a salvação e a aliança (Gênesis 6.13-22)
Deus revela a Noé seu plano:
“Darei fim a todos os seres humanos, porque a terra encheu-se de violência por causa deles” (v. 13).
Mas oferece a saída: a construção da arca. As instruções são detalhadas, com dimensões específicas: 135 metros de comprimento, 22,5 de largura e 13,5 de altura (v. 15), conforme a medida do côvado.
Walton (2018) observa que a arca de Noé contrasta com as embarcações descritas nos mitos do Oriente Próximo. Enquanto Utnapishtim, na Epopeia de Gilgamesh, constrói um barco cúbico, a arca bíblica tem proporções realistas e navegáveis, revelando a soberania e o cuidado de Deus.
Deus promete:
“Estabelecerei a minha aliança com você” (v. 18).
Essa é a primeira menção formal à aliança na Bíblia, demonstrando o compromisso divino com a preservação da vida e o cumprimento de seu plano redentor.
A salvação envolve também os animais e o sustento necessário (v. 19-21). O capítulo termina com a fidelidade de Noé:
“Noé fez tudo exatamente como Deus lhe tinha ordenado” (v. 22).
# | Evento | Referência | Data | Dia da Semana |
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1 | Anúncio do dilúvio | (7.4) | *10.2.600 | domingo |
2 | Começo do dilúvio | (7.11) | 17.2.600 | domingo |
3 | O dilúvio dura quarenta dias e termina | (7.12) | *27.3.600 | sexta-feira |
4 | Águas dominantes | (8.4) | 17.7.600 | sexta-feira |
5 | Aparecem os cumes dos montes | (8.5) | 1.10.600 | quarta-feira |
6 | Corvo enviado | (8.6,7) | *10.11.600 | domingo |
7 | Segunda viagem do pombo | (8.10) | *24.11.600 | domingo |
8 | Terceira viagem do pombo | (8.12) | *1.12.600 | domingo |
9 | Águas secam | (8.13) | 1.1.601 | quarta-feira |
10 | Noé deixa a arca | (8.14–18) | 27.2.601 | quarta-feira |
Que conexões proféticas encontramos em Gênesis 6?
Esse capítulo aponta diretamente para o juízo e a salvação escatológica revelados no Novo Testamento.
Jesus usou o dilúvio como exemplo do fim dos tempos:
“Assim como foi nos dias de Noé, assim também será na vinda do Filho do homem” (Mateus 24.37).
O apóstolo Pedro destaca a arca como símbolo da salvação em Cristo:
“Na arca, apenas algumas pessoas, a saber, oito, foram salvas por meio da água, e isso é uma figura do batismo” (1 Pedro 3.20-21).
Além disso, a aliança com Noé inaugura a série de alianças que culminam na nova aliança em Jesus (Hebreus 8.6-13).
O dilúvio também prefigura o juízo final descrito em Apocalipse 20, quando Deus julgará a humanidade, mas preservará os salvos.
O que Gênesis 6 me ensina para a vida hoje?
Ao ler Gênesis 6, fico impactado com a seriedade do pecado. Não se trata de algo pequeno ou irrelevante. O pecado destrói famílias, corrompe sociedades e afasta o homem de Deus.
Vejo também que, mesmo em meio à corrupção generalizada, é possível andar com Deus, como Noé fez. Ele não foi perfeito, mas foi fiel. Isso me lembra que, mesmo em tempos difíceis, posso escolher viver de forma íntegra.
O texto também me ensina sobre obediência prática. Noé precisou confiar em Deus a ponto de construir a arca, algo inédito e incompreensível para sua época. Muitas vezes, seguir a Deus exige fé e disposição para obedecer, mesmo sem entender tudo.
A arca representa a provisão de Deus. Assim como Noé encontrou refúgio nela, hoje encontro segurança e salvação em Cristo. A aliança de Deus me assegura que, apesar do juízo, Ele deseja preservar a vida e cumprir seu plano.
Como Gênesis 6 me conecta ao restante das Escrituras?
Este capítulo se encaixa perfeitamente no enredo bíblico:
- Em Gênesis 3, o pecado entra no mundo; em Gênesis 6, seus efeitos se intensificam.
- O dilúvio prefigura o juízo final (Mateus 24.37-39).
- A arca aponta para a salvação em Cristo (1 Pedro 3.20-21).
- A aliança com Noé prepara o caminho para as alianças com Abraão, Moisés e, por fim, em Jesus (Hebreus 8.6).
- O justo Noé é um protótipo do Justo por excelência, Cristo, que oferece salvação à humanidade corrompida.
Ao entender Gênesis 6, percebo que a Bíblia é uma grande história de queda e redenção, de juízo e esperança, de graça em meio ao caos.
Referências
- WALTKE, Bruce K.; FREDRICKS, Cathi J. Gênesis. Organização: Cláudio Antônio Batista Marra. Tradução: Valter Graciano Martins. 1. ed. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2010.
- WALTON, John H.; MATTHEWS, Victor H.; CHAVALAS, Mark W. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Antigo Testamento. Tradução: Noemi Valéria Altoé da Silva. 1. ed. São Paulo: Vida Nova, 2018.

Sou Diego Nascimento e o Jesus e a Bíblia não é apenas um projeto, é um chamado. Deus deu essa missão a mim e a Carol (esposa) por meio do Espírito Santo. Amamos a Palavra de Deus e acreditamos que ela pode mudar a sua vida, assim como mudou a nossa.