Hebreus 9 é um dos textos mais profundos do Novo Testamento sobre o sacrifício de Cristo e a superioridade da nova aliança. Toda vez que leio esse capítulo, fico impactado ao perceber como o autor mostra que, em Cristo, Deus resolveu de forma definitiva o problema do pecado e abriu um caminho real e eterno para nos relacionarmos com Ele.
Qual é o contexto histórico e teológico de Hebreus 9?
A Epístola aos Hebreus foi escrita em um momento de grande pressão para os cristãos judeus. Muitos estavam sendo tentados a abandonar a fé em Jesus e voltar ao judaísmo tradicional, com sua estrutura visível de culto, sacrifícios e sacerdócio. Nesse cenário, o autor, que permanece anônimo, demonstra com clareza que Cristo é superior a tudo o que o Antigo Testamento apresentou.
Simon Kistemaker destaca que o capítulo 9 é essencial para compreender o papel do sacerdócio de Cristo e o significado da nova aliança selada com seu sangue (KISTEMAKER, 2013).
Craig Keener lembra que o autor usa uma linguagem extremamente familiar ao público judeu, descrevendo o tabernáculo, os rituais e o sistema sacerdotal, para apontar como tudo isso se cumpre de forma definitiva em Cristo (KEENER, 2017).
Teologicamente, Hebreus 9 nos mostra que o culto do Antigo Testamento, por mais grandioso que fosse, era apenas uma sombra de algo maior. Cristo, o verdadeiro sumo sacerdote, entrou no santuário celestial e, com o seu próprio sangue, conquistou redenção eterna para os que creem.
Como o texto de Hebreus 9 se desenvolve?
1. O culto antigo e suas limitações (Hebreus 9.1-10)
O autor começa explicando:
“Ora, a primeira aliança tinha regras para a adoração e também um tabernáculo terreno” (Hb 9.1).
O tabernáculo, construído por Moisés, era dividido em duas partes: o Lugar Santo e o Santo dos Santos (Hb 9.2-3). No Lugar Santo ficavam o candelabro, a mesa e os pães da Presença (Hb 9.2). No Santo dos Santos estavam o altar de ouro para o incenso, a arca da aliança, o vaso com o maná, a vara de Arão que floresceu e as tábuas da aliança (Hb 9.4).
Acima da arca estavam os querubins da Glória cobrindo o propiciatório (Hb 9.5).
Todo esse sistema revelava a majestade de Deus e a separação entre Ele e o povo. Somente os sacerdotes podiam entrar regularmente no Lugar Santo (Hb 9.6). Mas o Santo dos Santos era acessado apenas uma vez por ano, pelo sumo sacerdote, e nunca sem sangue (Hb 9.7).
Essa limitação mostrava que o caminho para Deus ainda não estava plenamente aberto. Como explica Simon Kistemaker, o véu e os rituais indicavam que a reconciliação definitiva com Deus ainda dependia de algo maior (KISTEMAKER, 2013).
O texto afirma que tudo isso era “uma ilustração para os nossos dias”, pois os sacrifícios e cerimônias externas não podiam purificar a consciência do adorador (Hb 9.9).
Isso me faz refletir em como muitas pessoas ainda hoje se apoiam em rituais, tradições ou obras exteriores, sem compreender que só Cristo pode transformar o coração e a consciência.
2. O sacrifício perfeito de Cristo (Hebreus 9.11-22)
O autor então apresenta a grande revelação:
“Quando Cristo veio como sumo sacerdote dos benefícios agora presentes, ele adentrou o maior e mais perfeito tabernáculo, não feito pelo homem…” (Hb 9.11).
Jesus não entrou em um tabernáculo terreno, mas no próprio céu. E não levou o sangue de animais, mas o seu próprio sangue, garantindo redenção eterna (Hb 9.12).
Isso me lembra o que João Batista declarou: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (João 1.29). Cristo não foi apenas mais um sacerdote, mas o sacrifício definitivo.
O autor explica que, se o sangue de animais e as cinzas de uma novilha purificavam exteriormente, quanto mais o sangue de Cristo, que pelo Espírito eterno se ofereceu sem mácula, pode purificar nossa consciência (Hb 9.13-14).
Keener destaca que, enquanto os judeus estavam acostumados com a purificação exterior, o autor de Hebreus aponta para a purificação interior, aquela que transforma a mente e o coração (KEENER, 2017).
Cristo se tornou o mediador da nova aliança, garantindo a herança eterna aos que são chamados (Hb 9.15). O autor faz uma comparação com um testamento: ele só entra em vigor após a morte do testador (Hb 9.16-17).
Assim, a morte de Cristo foi necessária para validar a nova aliança. Isso já estava prefigurado na antiga aliança, quando Moisés aspergiu o povo com sangue ao entregar a lei (Hb 9.18-21).
O texto deixa claro: “Sem derramamento de sangue não há perdão” (Hb 9.22).
Isso me faz lembrar do que Deus disse a Moisés em Levítico 17.11: “É o sangue que faz expiação pela vida”. Desde o Antigo Testamento, Deus deixou claro que o preço do pecado é a morte, e somente o sangue pode trazer perdão.
3. A entrada definitiva no santuário celestial (Hebreus 9.23-28)
O autor conclui dizendo que as “cópias das coisas celestiais” (o tabernáculo terreno) precisavam ser purificadas com sacrifícios, mas o céu exige algo superior (Hb 9.23).
Cristo não entrou em um santuário feito por mãos humanas, mas no próprio céu, para se apresentar diante de Deus em nosso favor (Hb 9.24).
Essa verdade me traz grande consolo. Saber que Jesus, como sumo sacerdote, está na presença de Deus intercedendo por mim, me dá confiança para perseverar.
Diferente dos sacerdotes levíticos, que ofereciam sacrifícios repetidamente, Cristo se ofereceu uma vez por todas, no final dos tempos, para acabar com o pecado (Hb 9.25-26).
O texto diz ainda:
“Assim como o homem está destinado a morrer uma só vez e depois disso enfrentar o juízo, assim também Cristo foi sacrificado uma só vez para tirar os pecados de muitos; e aparecerá uma segunda vez… para trazer salvação àqueles que o aguardam” (Hb 9.27-28).
Eu me lembro aqui das palavras de Apocalipse 22.20: “Sim, venho em breve!” E a oração da igreja: “Amém. Vem, Senhor Jesus.”
Essa esperança me motiva a viver de forma santa, sabendo que o Salvador voltará para completar a salvação daqueles que o aguardam com fé.
Como Hebreus 9 se conecta com as profecias?
O capítulo todo está cheio de ecos do Antigo Testamento. O sistema do tabernáculo, o véu, o altar, o sangue, tudo apontava para Cristo.
Isaías já havia profetizado sobre o Servo Sofredor que “levou sobre si o pecado de muitos” (Isaías 53.11-12).
As palavras de João Batista revelam o cumprimento dessas profecias em Jesus: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (João 1.29).
Além disso, o fato de Cristo ter entrado no céu como nosso mediador cumpre o que estava simbolizado no sistema levítico, como vemos em Levítico 16, no Dia da Expiação.
Tudo converge para Jesus, o sumo sacerdote perfeito e o sacrifício definitivo.
O que Hebreus 9 me ensina para a vida hoje?
Esse capítulo fala muito ao meu coração. Eu aprendo que:
- Não preciso de intermediários terrenos. Jesus é meu sumo sacerdote diante de Deus.
- O acesso à presença de Deus está aberto. Posso orar e me aproximar com confiança.
- O perdão dos meus pecados foi conquistado de forma definitiva. Não preciso viver preso à culpa.
- A obra de Cristo é suficiente. Não há necessidade de rituais ou sacrifícios adicionais.
- Cristo voltará, e trará salvação completa aos que o aguardam com fé.
Esse texto me lembra que a fé cristã não se baseia em rituais ou símbolos vazios, mas na obra real e eterna de Cristo.
Que eu jamais me acomode ou me esqueça do privilégio que é viver sob a nova aliança, com o coração purificado e o caminho livre para me aproximar de Deus.
Referências
- KISTEMAKER, Simon. Hebreus. 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2013.
- KEENER, Craig S. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Novo Testamento. Tradução: José Gabriel Said. Edição Ampliada. São Paulo: Vida Nova, 2017.
- Bíblia Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Sociedade Bíblica Internacional, 2001.