O Salmo 122 faz parte da coleção dos “Cânticos de peregrinação” (Sl 120–134), recitados pelos israelitas durante suas subidas festivas a Jerusalém. Três vezes por ano, conforme a Lei de Moisés, todo homem devia se apresentar diante do Senhor no templo, por ocasião da Páscoa, do Pentecostes e da Festa dos Tabernáculos (Êxodo 23:14–17).
Esse salmo é atribuído a Davi, o rei que unificou as tribos, conquistou Jerusalém e estabeleceu ali a sede do governo e do culto (2Sm 5:6–10). Embora o templo ainda não estivesse construído em seus dias, Davi planejou e preparou todo o material para sua edificação. Sua visão era de um povo reunido para adorar, viver em paz e cultivar a justiça.
Hernandes Dias Lopes observa que “esse salmo encerra a primeira trilogia dos cânticos de romagem e expressa a alegria do povo ao chegar a Jerusalém” (LOPES, 2022, p. 1335). Para Calvino, “Davi se congratula com o povo por Deus ter designado um local definitivo para sua habitação, fortalecendo a fé e incentivando o culto legítimo” (CALVINO, 2009, p. 335).
John H. Walton destaca um aspecto cultural importante: “um tribunal era montado no portão da cidade para que o rei julgasse causas, reforçando Jerusalém como sede de justiça” (WALTON et al., 2018, p. 720). Assim, a cidade combinava governo, adoração e comunhão – uma representação do Reino de Deus na terra.
1. A alegria do povo de Deus (Sl 122:1–2)
>>> Inscreva-se em nosso Canal no YouTube
“Alegrei-me com os que me disseram: ‘Vamos à casa do Senhor!’ Nossos pés já se encontram dentro de suas portas, ó Jerusalém!” (Sl 122:1–2)
O salmo começa com uma explosão de alegria. Davi celebra o convite para ir à Casa do Senhor. Não é uma caminhada solitária, mas coletiva. O uso do plural mostra que a peregrinação é vivida em comunhão. Para o fiel israelita, ir a Jerusalém era um privilégio, não um fardo.
Calvino afirma que “a alegria de Davi nasce da obediência do povo ao oráculo de Deus, que indicava Jerusalém como lugar de adoração” (CALVINO, 2009, p. 335). Essa alegria, então, é resultado de reverência, comunhão e expectativa cumprida.
Ao ler esse versículo, eu me lembro da alegria que sinto ao me reunir com outros cristãos para cultuar a Deus. Mesmo em semanas difíceis, o convite para estar na presença do Senhor com os irmãos me anima e fortalece. É como o que lemos em Salmo 84: “melhor é um dia nos teus átrios do que mil noutro lugar”.
2. A comunhão no culto (Sl 122:3–4)
“Jerusalém está construída como cidade firmemente estabelecida. Para lá sobem as tribos do Senhor, para dar graças ao Senhor, conforme o mandamento dado a Israel.” (Sl 122:3–4)
O salmista enxerga Jerusalém como uma cidade bem estruturada. No original, a ideia é de uma cidade compacta, bem planejada, cujas partes estão unidas. A imagem simboliza a unidade do povo de Deus.
Derek Kidner, citado por Hernandes Dias Lopes, afirma que “os laços eram mais do que os de sangue ou conveniência; eram laços espirituais, unidos pelo culto ao Senhor” (LOPES, 2022, p. 1337). Ali, cada tribo deixava suas diferenças de lado e se unia como povo da aliança.
Eu aprendo aqui que o culto cristão é mais do que presença física. Ele é comunhão espiritual. Quando adoramos juntos, nos tornamos parte visível do corpo de Cristo. Essa unidade é um testemunho ao mundo e um reflexo da Jerusalém celestial, descrita em Apocalipse 21.
3. A justiça no Reino de Deus (Sl 122:5)
“Lá estão os tribunais de justiça, os tribunais da casa real de Davi.” (Sl 122:5)
O trono de Davi e os tribunais da cidade formavam o centro administrativo de Israel. Em Jerusalém, culto e justiça caminhavam juntos. O lugar do templo era também o lugar da lei, onde o rei julgava com equidade.
Calvino observa que “Davi afirma que o trono foi estabelecido ali por Deus, e que o governo de sua descendência seria firme, apontando para a vinda de Cristo” (CALVINO, 2009, p. 337). A cidade não era apenas símbolo de religiosidade, mas de um reino sustentado pela justiça divina.
Ao refletir sobre isso, eu me lembro que, como cristão, sou chamado a praticar a justiça. Não basta adorar no templo, é preciso viver a justiça no cotidiano. Essa mensagem aparece com força também em Salmo 15, onde a integridade e a justiça definem quem pode permanecer na presença de Deus.
4. A oração pela paz da cidade (Sl 122:6–9)
“Orem pela paz de Jerusalém: ‘Vivam em segurança aqueles que te amam! Haja paz dentro dos teus muros e segurança nas tuas cidadelas!’” (Sl 122:6–7)
Davi convida o povo à intercessão. Jerusalém significa literalmente “cidade da paz”, mas esteve muitas vezes em conflito. Por isso, a oração é pela preservação da paz externa (contra inimigos) e interna (entre irmãos).
Spurgeon, citado por Lopes, comenta: “Uma igreja deve ser uma só em crença, uma só em coração, uma só em testemunho, uma só em aspiração” (LOPES, 2022, p. 1338). A paz da cidade é também a paz da igreja, que deve ser cultivada com zelo.
Como cristão, eu aprendo que a paz da minha igreja local é responsabilidade minha. Eu oro, sirvo, coopero e perdoo – porque a paz não nasce do acaso, mas da obediência e do amor. Isso também é reforçado em Efésios 4, onde somos exortados a preservar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz.
“Em favor de meus irmãos e amigos, direi: ‘Paz seja com você!’ Em favor da casa do Senhor, nosso Deus, buscarei o seu bem.” (Sl 122:8–9)
A motivação da oração de Davi é relacional e espiritual. Ele deseja a paz porque ama seus irmãos e porque ama o Senhor. A cidade é o lugar onde a comunidade de fé se reúne para cultuar.
Calvino afirma: “Quem é indiferente à condição da igreja é tão cruel quanto os ímpios. Não há piedade verdadeira onde não há zelo pela casa de Deus” (CALVINO, 2009, p. 340). Amar o Senhor é amar sua casa, sua cidade, seu povo.
Eu aprendo que devo buscar o bem da igreja com palavras e ações. Isso inclui orar, contribuir, servir e proteger a comunhão.
Cumprimento das profecias
O Salmo 122 aponta para realidades futuras cumpridas em Cristo. A cidade de Jerusalém simboliza o lugar da presença de Deus. No Novo Testamento, Jesus se apresenta como o novo templo (Jo 2:19–21), o verdadeiro Filho de Davi, o Príncipe da Paz (Is 9:6).
A igreja é agora a Casa do Senhor (1Tm 3:15), formada por pedras vivas (1Pe 2:5), onde habita o Espírito Santo (1Co 3:16). A Jerusalém física perde sua centralidade, pois a adoração verdadeira não está mais presa a um lugar (Jo 4:21–24).
Essa promessa se cumpre plenamente na Nova Jerusalém, que desce dos céus, onde não há templo, pois o próprio Deus habita com seu povo. Ali, toda oração pela paz será definitivamente respondida (Apocalipse 21).
Significado dos nomes e simbolismos do Salmo 122
- Jerusalém – “Cidade da paz”, símbolo da comunhão espiritual e da presença de Deus entre seu povo
- Casa do Senhor – Lugar de encontro com Deus, hoje representado pela igreja
- Tribunais da casa de Davi – Expressão do reinado justo e messiânico
- Portas de Jerusalém – Imagem da chegada ao destino espiritual e à presença do Senhor
- Muros e cidadelas – Representações da proteção divina e da estabilidade da fé
Lições espirituais e aplicações práticas do Salmo 122
- A alegria de estar com o povo de Deus é sinal de saúde espiritual – Cultuar com os irmãos deve nos alegrar e fortalecer
- A unidade no culto agrada a Deus – Como Jerusalém, somos chamados a ser uma igreja compacta e unida
- Justiça e adoração caminham juntas – Uma igreja justa manifesta o caráter de Deus ao mundo
- A oração pela paz da igreja é um dever de todos – A paz da casa do Senhor depende do zelo de seus membros
- Amar a igreja é amar a Deus – Servir, contribuir e proteger a comunhão é uma expressão concreta de fé
- Cristo é a Nova Jerusalém – Nele encontramos segurança, comunhão, adoração e esperança eterna
Conclusão
O Salmo 122 é uma celebração da comunhão com Deus e com o povo. Ele revela o coração de quem ama a presença do Senhor e deseja ver sua casa em paz. Como cristão, eu aprendo que o culto é mais do que liturgia: é encontro, unidade, justiça e missão. A verdadeira Jerusalém, que esperamos, é eterna. Até lá, devemos orar, servir e amar a igreja local como expressão da Casa do Senhor.
Referências
- CALVINO, João. Salmos. Org. Franklin Ferreira, Tiago J. Santos Filho e Francisco Wellington Ferreira; trad. Valter Graciano Martins. 1. ed. São José dos Campos, SP: Editora Fiel, 2009. v. 4, p. 335–340.
- LOPES, Hernandes Dias. Salmos: O Livro das Canções e Orações do Povo de Deus. Org. Aldo Menezes. 1. ed. São Paulo: Hagnos, 2022. v. 1 e 2, p. 1335–1341.
- WALTON, John H.; MATTHEWS, Victor H.; CHAVALAS, Mark W. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Antigo Testamento. Trad. Noemi Valéria Altoé da Silva. 1. ed. São Paulo: Vida Nova, 2018, p. 720.