O capítulo 8 de 2 Reis apresenta um período complexo e instável para os dois reinos: Israel (norte) e Judá (sul). O pano de fundo é marcado por idolatria, conflitos políticos e o avanço do juízo de Deus por meio de eventos históricos concretos. Ainda sob influência de Acabe e sua linhagem, o povo de Deus se encontrava espiritualmente distante da aliança, mesmo sendo alvo contínuo da graça e correção divina.
O ministério de Eliseu se destacava como um último esforço de Deus para chamar Israel ao arrependimento. Suas ações não eram apenas milagrosas, mas profundamente simbólicas: Deus ainda falava, mesmo em meio ao colapso espiritual do reino. Como observam Walton, Matthews e Chavalas (2018), “a fome de sete anos e os ataques sírios não eram apenas castigos aleatórios, mas mecanismos de correção divina” (p. 512).
Do lado de Judá, a situação também era crítica. A influência da casa de Acabe sobre Jeorão, rei do sul, revela um nível profundo de decadência. O texto destaca que ele “andou nos caminhos dos reis de Israel” (2 Rs 8.18), expressão usada para indicar infidelidade ao Senhor. Mesmo assim, a promessa feita a Davi ainda sustentava a sobrevivência do reino de Judá.
O povo de Deus estava sendo disciplinado, mas não abandonado.
Como Deus preserva os fiéis mesmo em tempos de apostasia? (2 Reis 8:1–6)
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“Saia do país com sua família e vá morar onde puder, pois o Senhor determinou uma fome nesta terra” (2 Rs 8.1)
A história da sunamita retorna como um testemunho da fidelidade de Deus aos que o amam. Eliseu, já ciente da fome que viria, orienta a mulher a deixar Israel. Essa ação mostra que Deus antecipa e provê livramento para seus filhos — mesmo em meio ao juízo coletivo.
Thomas Constable observa que “o Senhor revelou ao seu profeta que traria uma fome de sete anos como punição pela apostasia, mas protegeu a fiel sunamita tirando-a da região” (CONSTABLE, 1985, p. 552). É o mesmo cuidado que vemos em histórias como a de Noé, Ló ou José no Egito.
Após os sete anos, a mulher retorna e precisa reivindicar sua terra. Nesse ponto, vemos a soberania de Deus atuando com precisão: o rei Jorão está ouvindo de Geazi justamente o relato sobre Eliseu ter ressuscitado o filho dela (v. 5). E nesse exato momento, ela entra. A coincidência não é casual. É providência.
O rei, impactado, não só devolve a propriedade como também ordena que toda a renda dos anos anteriores seja restituída (v. 6). Segundo Walton (2018), “era comum que terras abandonadas se tornassem propriedade da Coroa, e raramente alguém recebia de volta a renda das colheitas durante sua ausência” (p. 512). O que ocorre aqui é milagre e justiça reunidos.
Ao ler isso, sou confrontado pela fidelidade de Deus. Mesmo quando o ambiente ao redor está corrompido, Ele cuida dos que confiam em sua Palavra.
Veja também esse princípio sendo reafirmado em Salmo 91, onde o Senhor promete livramento ao que habita no esconderijo do Altíssimo.
Por que Eliseu chorou diante de Hazael? (2 Reis 8:7–15)
“Porque sei das coisas terríveis que você fará aos israelitas” (2 Rs 8.12)
A segunda parte do capítulo muda de tom. Eliseu viaja até Damasco, a capital do reino inimigo da Síria. O rei Ben-Hadade está doente e envia Hazael para consultar Eliseu sobre sua recuperação.
O encontro é tenso. Eliseu revela que Ben-Hadade se recuperaria, mas morreria — o que se cumpre pela traição de Hazael no dia seguinte. Hazael sufoca o rei e assume o trono (v. 15). O choque maior, porém, é a emoção de Eliseu. Ele chora.
Por quê? Porque Deus lhe revela o futuro de sofrimento que Hazael causará a Israel. Como destaca Constable (1985), “as atrocidades que ele cometeria — inclusive rasgar o ventre de grávidas — fazem Eliseu estremecer e lamentar” (p. 553).
Esse trecho revela a dor de um profeta diante do juízo que virá. Eliseu não é indiferente. Ele sofre com o povo. Como Jesus chorou por Jerusalém em Lucas 19:41, Eliseu se compadece.
O assassinato de Ben-Hadade não apenas cumpre a profecia entregue a Elias em 1 Reis 19:15, mas também inaugura um reinado cruel que será instrumento do juízo de Deus contra a idolatria de Israel (2 Rs 10.32-33).
Hazael se torna rei sem linhagem nobre, como confirma um registro assírio citado por Constable: “Shalmaneser III o chamou de ‘filho de ninguém’” (CONSTABLE, 1985, p. 554). Isso mostra que Deus pode usar até os improváveis para cumprir seus propósitos.
Como Judá se corrompeu sob o reinado de Jeorão? (2 Reis 8:16–24)
“Ele andou nos caminhos dos reis de Israel… e fez o que o Senhor reprova” (2 Rs 8.18)
O cenário volta-se para Judá. Jeorão, filho de Josafá, assume o trono. Ao contrário de seu pai, ele rejeita os caminhos do Senhor. Seu casamento com a filha de Acabe, Athalia, foi politicamente estratégico, mas espiritualmente desastroso.
Ele reinou 8 anos em Jerusalém, mas seu legado é marcado pela idolatria e violência. Como mencionam Walton, Matthews e Chavalas (2018), “o assassinato dos irmãos de Jeorão logo no início do reinado parece ter sido influência direta de Athalia, uma prática comum no reino do norte, mas sem precedente em Judá” (p. 514).
O texto destaca dois episódios principais: a rebelião de Edom e a de Libna. Edom havia sido subjugado por Josafá, mas aproveitou a fraqueza de Jeorão para se libertar (v. 20). Jeorão tentou conter a rebelião, mas fracassou. O mesmo aconteceu com Libna (v. 22).
A aliança com o mal, mesmo com boas intenções políticas, cobra um preço espiritual e nacional. Deus preserva Judá por causa da promessa feita a Davi (v. 19), mas o juízo começa a se manifestar.
A morte de Jeorão, segundo 2 Crônicas 21, foi marcada por uma doença terrível nos intestinos. Uma morte lenta e dolorosa, cumprimento da palavra profética enviada por Elias.
Jeorão teve a chance de andar com Deus como seu pai Josafá. Mas preferiu repetir os erros de Acabe.
Essas narrativas se conectam ao Novo Testamento?
Sim. Vemos ecos claros do ministério profético e do padrão de rejeição à verdade que se estende até o Novo Testamento.
A preservação da sunamita lembra a proteção prometida por Jesus aos que ouvem e obedecem sua Palavra (Mt 7.24-25). Já a ascensão de Hazael, um homem cruel, como instrumento de juízo, remete à soberania de Deus mesmo sobre governantes ímpios, como Pilatos ou Herodes.
Além disso, Jeorão e sua aliança com o mal refletem o que o apóstolo Paulo descreve em 2 Coríntios 6:14: “que comunhão há entre luz e trevas?”
As escolhas feitas por reis e nações ainda são reflexos da mesma luta espiritual que se desenrola desde Gênesis. E Deus, imutável, continua tratando com justiça e misericórdia.
Quais lições práticas podemos aplicar em nossa vida hoje?
- A fidelidade de Deus sustenta seus servos em meio ao caos – A sunamita foi protegida em plena fome e restaurada com abundância. O mesmo Deus cuida de nós.
- A soberania divina controla até os detalhes mais improváveis – O rei estava ouvindo sobre ela exatamente quando ela apareceu. Deus governa o tempo.
- O pecado traz consequências inevitáveis – Jeorão colheu o fruto de sua idolatria. O mesmo vale para qualquer um que endurece o coração.
- O verdadeiro homem de Deus sente dor pelo juízo – Eliseu chorou ao saber da destruição que viria. Precisamos orar com compaixão por um mundo que sofre.
- As alianças erradas comprometem o futuro – O casamento político de Jeorão com Athalia destruiu Judá por gerações. Precisamos vigiar nossas associações.
- Deus não esquece suas promessas – Ele preserva Judá por amor a Davi. Também guardará nossa vida por amor a Jesus, o descendente de Davi.
Conclusão
2 Reis 8 é um retrato da tensão entre juízo e misericórdia. Enquanto Israel se afasta cada vez mais de Deus, Ele ainda preserva um remanescente fiel. A mulher sunamita é um símbolo da graça em meio à disciplina. Já Hazael e Jeorão revelam a seriedade com que Deus lida com o pecado — usando até nações inimigas para cumprir sua justiça.
Mas, mesmo nos momentos mais sombrios, a promessa permanece: Deus não falha. Ele levanta profetas, protege os seus e cumpre Sua palavra. Como aprendemos em Apocalipse 21, a história caminha para a restauração final — mas até lá, precisamos decidir se ouviremos ou resistiremos à voz do Senhor.
Referências
- CONSTABLE, Thomas L. 2 Kings. In: WALVOORD, J. F.; ZUCK, R. B. (Orgs.). The Bible Knowledge Commentary: An Exposition of the Scriptures. Vol. 1. Wheaton, IL: Victor Books, 1985. p. 552–554.
- WALTON, John H.; MATTHEWS, Victor H.; CHAVALAS, Mark W. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Antigo Testamento. Tradução: Noemi Valéria Altoé da Silva. 1. ed. São Paulo: Vida Nova, 2018. p. 512–514.
- Bíblia Sagrada. Nova Versão Internacional (NVI). São Paulo: Sociedade Bíblica Internacional, 2001.

Sou Diego Nascimento e o Jesus e a Bíblia não é apenas um projeto, é um chamado. Deus deu essa missão a mim e a Carol (esposa) por meio do Espírito Santo. Amamos a Palavra de Deus e acreditamos que ela pode mudar a sua vida, assim como mudou a nossa.