Ezequiel 9 me ensina que Deus distingue os que lamentam o pecado e se afasta de quem se acomoda no mal. O juízo começa na casa de Deus. Ezequiel vê anjos executores, mas também um homem com estojo de escriba que marca os fiéis. Enquanto muitos são destruídos, um pequeno grupo é poupado por demonstrar arrependimento. Ao ler esse capítulo, percebo que Deus vê o que me aflige, o que lamento, e isso importa para Ele. O sofrimento pelo pecado alheio é um sinal de fidelidade.
Qual é o contexto histórico e teológico de Ezequiel 9?
O capítulo 9 de Ezequiel está diretamente ligado à visão iniciada no capítulo 8, onde o profeta é conduzido em espírito para ver as abominações praticadas no templo de Jerusalém. Essas transgressões provocaram a ira de Deus. Agora, a visão mostra o juízo divino começando pela própria casa do Senhor.
Estamos por volta do ano 592 a.C., durante o exílio babilônico. Ezequiel, que foi deportado junto com o rei Joaquim, está entre os exilados no rio Quebar. Mesmo distante de Jerusalém, ele recebe visões detalhadas do que Deus está prestes a fazer com a cidade e seu povo. A situação espiritual em Judá é crítica: idolatria, violência e desrespeito à aliança tomaram conta da nação.
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Segundo Block (2012), a estrutura literária do capítulo 9 mostra que ele é parte de uma sequência cuidadosamente construída. Há conexões diretas com o capítulo 8, tanto por meio de expressões quanto pela continuidade narrativa. Isso revela um julgamento coordenado: a paciência de Deus se esgotou, e agora vem a justiça.
Walton, Matthews e Chavalas (2018) apontam que a figura do escriba com o estojo é semelhante a Nabu, o deus babilônico dos escribas. Mas aqui, esse personagem atua a serviço de Yahweh, marcando aqueles que ainda se mantêm fiéis — uma clara mensagem de que o Senhor, e não os ídolos da Babilônia, tem o controle final sobre a vida e a morte.
Como o texto de Ezequiel 9 se desenvolve?
Quem são os sete personagens da visão? (Ezequiel 9.1–2)
Ezequiel ouve a voz de Deus convocando os executores da cidade. Seis homens armados aparecem, vindos do portão do norte. Com eles há um sétimo personagem, vestido de linho e com um estojo de escrevente à cintura.
O número sete sugere completude. Os seis executores representam a destruição, enquanto o homem de linho carrega a responsabilidade de marcar os que serão poupados. Ele é uma figura sacerdotal ou angelical. Como diz Block (2012), o linho era usado tanto por sacerdotes quanto por seres celestiais (cf. Daniel 10.5; 12.6–7).
Eles se posicionam ao lado do altar de bronze, local que antes fora central na adoração legítima. Mas agora é palco da sentença divina.
Por que a glória do Senhor se move? (Ezequiel 9.3)
A glória de Deus se ergue de sobre os querubins e se dirige à entrada do templo. Isso é um sinal terrível. Mostra que Yahweh está prestes a deixar o templo. A partida de sua glória representa o abandono do povo ao próprio destino. Como explica Block, isso antecipa a grande retirada que será descrita em Ezequiel 10.
Esse movimento é o prelúdio do juízo. Quando Deus se retira, o juízo vem. Isso me ensina que não existe segurança onde Deus não habita mais.
Quem recebe a marca na testa? (Ezequiel 9.4)
O homem de linho é encarregado de percorrer a cidade e marcar na testa “aqueles que suspiram e gemem por causa de todas as práticas repugnantes que são feitas nela”. A marca é a letra hebraica taw, que no alfabeto paleo-hebraico tinha a forma de um X ou cruz.
Essa marca é sinal de pertencimento, uma espécie de selo de Deus sobre os fiéis. Walton, Matthews e Chavalas (2018) observam que a taw também era usada como assinatura. Isso pode indicar que os marcados pertencem ao Senhor.
O que me toca nesse versículo é que Deus presta atenção em quem sofre pelo pecado da sociedade. Ele vê os que choram em silêncio, os que não se conformam. Não é apenas uma postura moral, mas uma expressão de lealdade à aliança.
Por que o juízo começa no templo? (Ezequiel 9.5–7)
Os executores recebem ordens claras: matar sem piedade. Idosos, jovens, mulheres e crianças — todos devem morrer, exceto os que têm o sinal. E devem começar pelo templo.
Isso revela uma verdade dolorosa: a religião sem arrependimento atrai juízo. Deus começa pelo lugar onde deveria haver santidade. Os anciãos que estavam no templo (cf. Ezequiel 8.11) são os primeiros a morrer.
Ezequiel vê o templo sendo contaminado por cadáveres. O lugar santo se torna cenário de horror. Isso mostra que o juízo de Deus não poupa estruturas religiosas vazias.
Como Ezequiel reage diante da destruição? (Ezequiel 9.8)
O profeta fica sozinho, cai com o rosto em terra e clama: “Vais destruir todo o remanescente de Israel?”. É uma pergunta cheia de dor. Ezequiel sabe que, humanamente, não há esperança.
Essa é a reação natural de quem ama seu povo e reconhece a gravidade do pecado. Ele não tenta defender os culpados, mas suplica por misericórdia.
Essa intercessão lembra a de Moisés (Êxodo 32) e a de Abraão (Gênesis 18). Mesmo diante do juízo, os justos oram pelos outros.
Qual é a resposta de Deus? (Ezequiel 9.9–10)
Deus responde com firmeza. O pecado de Israel chegou ao limite. A terra está cheia de sangue e a cidade de injustiça. O povo acredita que o Senhor os abandonou e não vê o que fazem.
Mas Deus vê. E agora, lança sobre eles as consequências de suas ações. Ele reafirma que não terá piedade. A aliança foi violada repetidamente, e o tempo da paciência chegou ao fim.
Essa resposta ecoa Romanos 1.18–32, onde Paulo descreve um juízo semelhante: Deus entrega os homens às suas próprias escolhas. O castigo não é apenas externo, mas uma entrega interna ao caos moral.
O que o escriba relata no fim da visão? (Ezequiel 9.11)
O homem de linho retorna e diz: “Fiz o que me ordenaste”. Isso fecha a cena com sobriedade. A missão foi cumprida. Os marcados foram identificados. Os demais, entregues à justiça.
O silêncio que segue é eloquente. Nenhuma celebração, nenhuma explicação adicional. Só o peso do juízo executado.
Como Ezequiel 9 se cumpre no Novo Testamento?
O capítulo 9 tem paralelos evidentes com Apocalipse 7, onde 144 mil servos de Deus são selados na testa antes do juízo. Lá, o selo protege os fiéis da destruição. Aqui, a taw separa os justos dos ímpios.
A marca é também evocada em Apocalipse 14.1, onde os redimidos têm o nome do Cordeiro escrito na testa. Isso mostra que, no fim, Deus sabe quem é dEle — e guarda cada um.
Jesus também ensina essa distinção espiritual em Mateus 13.24–30, na parábola do joio e do trigo. Os dois crescem juntos, mas no tempo certo, Deus separará.
Essa separação definitiva entre os que pertencem a Deus e os que rejeitam Sua verdade já estava presente em Ezequiel. A marca, a intercessão e o juízo se cumprem plenamente em Cristo e no fim dos tempos.
O que Ezequiel 9 me ensina para a vida hoje?
Ao ler Ezequiel 9, percebo que não basta apenas evitar o pecado. Deus se importa com minha postura diante do mal ao meu redor. Os marcados não eram apenas puros — eram sensíveis. Gemiam, sofriam, se angustiavam.
Isso me leva a refletir: tenho me acomodado ao pecado da minha geração? Ou ainda lamento o que ofende a santidade de Deus?
Também aprendo que o juízo começa pelos que estão perto do altar. A responsabilidade espiritual é proporcional à luz que recebemos. Se estou mais perto de Deus, devo viver com mais temor e pureza. Não posso esconder-me atrás da religiosidade.
Outro ponto importante é que Deus sempre reserva um remanescente. Mesmo que pareça que tudo está perdido, Ele preserva os que Lhe pertencem. E Ele vê cada gemido, cada lágrima, cada oração secreta.
A marca na testa simboliza propriedade, mas também proteção. Isso me lembra que, em Cristo, recebo o selo do Espírito (Efésios 1.13). Não pelo que faço, mas por quem sou nEle.
Por fim, o silêncio de Ezequiel diante da execução do juízo me ensina reverência. Nem tudo é para ser explicado. Algumas visões devem nos levar à adoração, à intercessão e ao arrependimento.
Referências
- BLOCK, Daniel I. O livro de Ezequiel. Tradução: Déborah Agria Melo da Silva et al. 1. ed. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2012.
- WALTON, John H.; MATTHEWS, Victor H.; CHAVALAS, Mark W. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Antigo Testamento. Tradução: Noemi Valéria Altoé da Silva. 1. ed. São Paulo: Vida Nova, 2018.
- Bíblia Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Sociedade Bíblica Internacional, 2001.